Quinca Sapateiro era personagem popular na minha terra. Conheci-o ainda no tempo de Admissão ao Ginásio, quando eu passava pela Rua Barão do Rio Branco, em direção à escola de Helena Oliveira, na calçada alta da Ponte do Padre. Entre os vários empregados ou aprendizes da fabriqueta de calçados de Evilásio Brito, estava o Quinca batendo sola, único deles que me ficou na lembrança.
Passaram-se décadas até que um dia deparei-me com o Quinca trabalhando na sua própria tenda, à Rua Nilo Peçanha. Reconheci-o imediatamente. Era um homem que escutava muito o rádio e gostava de imitar pessoas. A preferência pelas imitações era o Lelé, ex-tropeiro, autodidata e decoreba da Geografia. Quinca Sapateiro também preferia contar casos da cidade e comentar as notícias do estrangeiro ouvidas pelo rádio.
Segundo o jornal “Quinca”, havia um cidadão muito conhecido na cidade, cuja mulher gostava da safadeza. Quando chegava algum homem para um encontro com ela, esse encontro era na própria residência da mulher. O maridão ficava na porta amolando uma peixeira 12 polegadas e, resmungando: “Um dia eu derrubo o fato dum; um dia eu derrubo o fato dum”.
O visitante, para não demonstrar sinal de fraqueza, segundo o sapateiro, entrava pela porta estreitada, resvalando de lado, entre o portal, a faca gigante e o marido que ameaçava derrubar o fato dum.
Ninguém, entretanto, chegou, a saber, se fato algum foi derrubado, embora ninguém possa confiar totalmente em ameaça dessa gente.
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Em vésperas de eleições brasileiras, todos os candidatos prometem honestidade, trabalho e transparência.
Uma vez no poder, o sujeito trinca os dentes amolando uma 12 polegadas, para sugestionar o povo. Mas, lá nos fundos, após a porta, continua deitada a corrupção, prostituta miserável que ainda faz a alegria dos tarados.
As horas, diziam muita coisa, porque cada uma delas sempre tinha algo a dizer. Uma mulher pode parecer quem realmente nunca foi. Assim como o homem, quem realmente sempre fora pode aparentar. Tudo depende do lugar, do momento, especialmente da hora. Aquela mulher que atravessava a rua – que pena – não era Maria Rita. Naquele instante Ulisses experimentava tal situação, evocara a lembrança de seus irmãos. E pra qualquer lugar que olhasse – traído era pelos próprios sentidos – via a cada um deles.
Os meninos não estavam mais na praça. O azul do mundo não estava mais lá. Ainda assim pra Ulisses, tudo permanecia retido em suas pupilas. O calor na calçada refratário aos poucos se dissipando junto com a tarde. Zelosa a mãe cuidaria pra que o menino não sentasse naquele chão. “- Por que mãe?” “-Porque dá dor de barriga!” Cheiro de café torrado, de invadir narinas, pulmões e mentes. A se embrenhar pelos pomares das cercanias, a misturar-se ao perfume das mangas, limões, frutas do conde, no sertão chamadas de pinhas. Ao sabor duma ou outra suave brisa adoçada pelo cítrico aroma.
“-Rapadura batida!” Ainda pelos becos ecoavam os gritos dos meninos, xingando o redemoinho. E o carrossel de cisco e poeira partia doido no encalço deles. Novamente Ulisses e suas lembranças fazendo-se prostrado, maravilhado. Um gato preto, não conseguindo ficar camuflado, fora visto. E deu-se início um encalço ao pobre bichano. A luta pela vida, contra a morte. Meninos e gatos: dois seres neste mundo de meu Deus que nunca se entenderam. Haveria de ter uma explicação pra desavença entre tais criaturas. Haveria de ser algo do outro mundo. Já os cães, eles os respeitavam. Gatos pretos, rasga-mortalhas, urubus, morcegos, mariposa negra presságio de má sorte. Messias e Lucas, não eram irmãos, mas vivam sempre juntos, tinham a fama de exterminadores de todo e qualquer animal, de igual ou menor porte que eles. Ódio aos gatos, porque comiam passarinhos de gaiolas, o peixe da mãe estendido pra secar, amolavam suas malditas unhas, no forro do sofá, pra marcarem território urinavam nas coisas. Outro dia, no oitão do grupo escolar Messias e Lucas armaram uma arapuca pra urubu e conseguiram pegar um. Todo amarrado o pobre foi arrastado pra dentro da sala de aula, a professora Carmem obrigou-os a soltar. Algazarra. O instinto de defesa fez o bicho regurgitar um líquido nojento, fedido, na sala. Naquele dia não teve mais como continuar a aula.
Maria Vitória, uma moça bonita, educada. Resumir assim, em apenas duas palavras a gazela seria uma desfeita imperdoável. Bonita sim, de possuir longo cabelo negro, de seda, a moldar-lhe o rosto moreno. Bonita de belos olhos castanhos, amendoados. Encimados por sobrancelhas sinuosas, o ponto chamativo do rosto. A boca de lábios carnudos, a evocar-lhe as origens nativa, aborígene. Orelhas de lóbulos pingentes. O pescoço gracioso, bem implantado, espáduas de deusa titânica. Os braços estendidos ao longo do corpo emolduravam seu busto firme. Os seios duas fontes de vigor, de vida, de pecado. Impossível a qualquer um que olhasse pra eles não pecar. Seu ventre mesmo coberto pelo vestido vaporoso – dava saber – fonte de prazer indizível. A acender, adormecidos desejos, a um varão que pusesse ali sua imaginação. Ao que haveria de encontrar se se aventurasse sob aquele tecido de algodão, se evaporariam os brios. Pelos caminhos alucinantes dos pelos, sobre pele cuidada. Donde emanava do próprio corpo, perfume de fêmea, lancinante. E eriçariam se tocado com a leveza da paixão, a sutileza do desejo, e brotaria volúpia, tão da carne. O cheiro de mulher permanecido sob os pelos do montículo de Vênus. Gruta ardente, esconderijo da flor de Lácio. Intumescência de paixão velada, contida. Graças aos céus, haveria de se ter – o poder, sempre – o controle de pensamentos e atos. Bem velado, no íntimo do ser. Sob as cobertas escuras da mente, no mar da libido navegavam, os escrúpulos do homem navegam. E – em vigor de virilidade – fatalmente naufragariam, se falassem mais alto, os mais secretos e vis extintos. Maria Vitória aquela tão linda menina-moça, era filha de Maria Rita. A benção do tio, um beijo na mão. Um abraço, um afago na cabeça, selado estava o encontro.
Um pedaço de jornal bolando pela calçada esbarrou num pé do banco da praça onde se haviam sentado. A primeira página de “O Globo” trazia uma manchete estampada: “Morre o Ex-Presidente Epitácio Pessoa” O fragmento do periódico carioca, era de uma semana anterior aquela. Dizia que naquele 13 de fevereiro de 1942, por problemas cardíacos agravados viera a falecer no Sítio Nova Betânia em Petropólis – Rio de Janeiro, o estadista Epitácio Pessoa. Daí por diante uma extensa biografia da vida pública do ex-presidente que governara o país de 1919 a 1922. Entre outras obras que realizara: “A construção de 200 açudes no nordeste; criação da Universidade do Rio de Janeiro; a substituição da Libra pelo dólar como padrão monetário brasileiro; inauguração da primeira estação de rádio do Brasil, no dia 07 de setembro de 1922 centenário da independência, a Rádio Sociedade do Rio de Janeiro pela primeira vez ia ao ar.” Dizia ainda que seu governo ficaria marcado para sempre, primeiro porque fora o único presidente até então, eleito estando fora do país, quando ocorrera as eleições se encontrava na Conferência de Versalhes. Teve como opositor nada menos que o jurista Rui Barbosa. Outro fato marcante “A Semana de Arte Moderna” em fevereiro de 22, que teve a participação de nomes como: Oswald de Andrade, Mario de Andrade, Manuel Bandeira, Anita Malfatti. No verso da página o Carnaval Carioca, foto da Escola de Samba Portela que sagrara-se bicampeã, desfilando no domingo, 15 de fevereiro, na Praça 11, com o enredo “A Vida no Samba” de Alvaiade e Chantim que falava justo de pessoas como Maria Vitória.
“Samba foi uma festa dos índios
Nós o aperfeiçoamos mais
É uma realidade
Quando ele desce do morro
Para viver na cidade”
Ulisses disse do quanto a sobrinha tinha da mãe. Contou que Maria Rita era tão calada. E que sua mãe – avó de Maria Vitória – temeu que a menina fosse ficar surda-muda pois demorou tanto a falar. Dona Mãezinha a ama de leite, era uma espécie de curandeira. Na falta do médico era buscada para socorrer nos “incômodos” tanto da mulher, quanto de suas crias recentes. Pro caso da demora a falar, aconselhava colocar um pinto em baixo duma bacia, e bater no tampo com algo que fizesse bastante barulho, próximo aos ouvidos da criança. Só assim foi como Vitória desarnou a falar. Pra andar também nada fácil. E outra benzedura teve que ser feita: com os pés da menina, batiam várias vezes dentro dum pilão, como se fosse à mão daquele. Dona mãezinha recomendaria ainda uns chás, e a mãe da criança tinha que fazer uma penitência pra alcançar a graça. Poderia ser – uma romaria – ir a Juazeiro do padrinho Ciço Romão Batista de pé; durante um ano ir a missas da primeira sexta-feira de cada mês; guardar as sextas-feiras por um ano sem comer carne de criação. Era considerada carne de criação, todo bicho que mamasse, tivesse sido caçado ou pescado, e claro, criado no terreiro de casa.
Certeza de uma coisa Ulisses tinha agora, queria voltar pra casa. A velha casa do sertão, do fogão a lenha, do abano de palha de coqueiro, do pote d’água fria num canto da cozinha. A camarinha no quarto. Na sala, o retrato a lápis, o pai de paletó e gravata, que jamais tivera na vida. Com os irmãos, a correr de pés descalço pelo terreiro. Zelosa a mãe ordenaria que desemborcassem as chinelas porque filho que deixava calçados emborcados, xingava os pais, além de agourar pra morte cedo. Cheiro de café torrado, de invadir narinas, pulmões, cheiro que nunca mente. A se dissipar pelo pomar das cercas minhas, a misturar-se ao perfumo, doce caldo das mangas, limões. Frutas do conde, no sertão é chamada de pinha.
Quem acompanha de perto o que se passa no país, tem um respeito muito grande pelo menos por duas gloriosas empresas. Uma delas é a Embrapa, a quem tiramos permanentemente o chapéu. Outra é sem dúvida alguma, a Embraer.
Vamos abrir esse espaço merecido para divulgação.
“A Embraer fez o voo inaugural do novo avião de transporte militar KC-390, nesta terça-feira (3). A aeronave, a maior já fabricada no país, sobrevoou por 1h25 a região de Gavião Peixoto (SP). Um acordo com o governo prevê o fornecimento de 28 jatos militares do modelo à Força Aérea Brasileira (FAB) ao longo de 10 anos – a primeira entrega está programada para o 2º semestre de 2016.
Esse é o início dos testes com o protótipo para avaliar as qualidades e desempenho da aeronave. O cargueiro tem 35 metros de comprimento e capacidade para transportar até 23 toneladas. O modelo começou a ser desenvolvido em 2009.
No voo teste nesta terça, os pilotos sobrevoaram uma região de fazendas fazendo manobras e testes de sistemas, além de testes em solo. Para obter as certificações e poder operar, a aeronave deve passar por cerca de duas mil horas de voo, o que deve levar até um ano e meio.
A partir de 2016, os aviões KC-390 vão substituir a frota de aviões Hércules, que são usados pela FAB há mais de cinco décadas. O contrato para aquisição dos novos cargueiros foi assinado com a Embraer em maio de 2014.
O compartimento de carga do jato militar tem capacidade para acomodar blindados, peças de artilharia, armamentos e até aeronaves semi-desmontadas. Uma frota de até 80 soldados ou 64 paraquedistas também pode ser levada a bordo. O KC-390 é equipado também com um reabastecedor, que pode transferir combustível em voo para outras aeronaves.
Além da encomenda das 28 aeronaves da FAB, existem atualmente intenções de compra de outros países. Um hangar em Gavião Peixoto foi inaugurado para a linha de montagem.
O contrato para produção em série para o governo prevê investimento de R$ 7,2 bilhões. Mais de 1,5 mil trabalhadores estão envolvidos diretamente no trabalho”.
Dê condições aos seus cientistas e o Brasil se firmará no mundo.
CAMPEÃ MISS AMAZONAS. Foto: (Marcos Dantas – G1 AM)
Notícias inusitadas desse tipo correm mundo. O concurso de Miss Amazonas, além do seu êxito natural, ganhou complemento hilariante e justiceiro. A senhorita Carol Toledo estava muito feliz ao ser apontada como a vencedora do concurso que eleva a vaidade das mulheres.
Acontece, porém, que a concorrente que ficou em segundo lugar, senhorita Sheislane Hayalla, resolveu fazer justiça com as próprias mãos, ao menos pela metade. Inconformada com o resultado desfavorável, a segundona achou que a vitória da sua rival deveu-se ao poder do dinheiro que manda em Manaus. Contra a suposta injustiça e o poder econômico, Sheislane aguardou que a campeã fosse coroada e em seguida partiu para o ataque. Arrancou-lhe a coroa da cabeça (pior seria se tivesse arrancado à cabeça) jogou-a ao chão dizendo que “ela não mereceu”.
Negócio danado, não meu amigo?
Essa foi a edição 2015 do concurso Miss Amazonas, cuja confusão aconteceu na última sexta, dia 30 no Centro de Convenções Vasco Vasques ─ Zona Centro-Oeste de Manaus.
Claro, se a Sheislane estava certo ou errada não sabemos. A atitude correta seria apelar às vias legais a quem de direito. Mas quem pode sustentar a raiva e a revolta e guardar tudo para embrulho?
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Pedimos democracia no Brasil. Lutamos pelo fim da ditadura, onde não havia senador, vereador, deputado e somente a lei da botina imperava no país. Mas lutamos pela liberdade para quê? Para alojar meio mundo de parlamentares que sozinhos carregam o dinheiro sagrado do povo brasileiro! Está aí à assembleia alagoana que até hoje ninguém conseguiu saber quanto ganha oficialmente um deputado e quanto leva cada um no bolo mensal para seus longos bolsos.
Parlamentares da inutilidade deveriam ganhar o mesmo salário dos professores, salário seco sem direito à manobra nenhuma. Mas o que vemos é que não há receita da boba serena que o estado apure que consiga matar a sede dessa areia movediça.
Nem à Justiça pode com a assembleia que brinca de zombar constantemente como vemos nas notícias e mais notícias nos jornais e sites alagoanos.
Depois, eles não querem a ditadura militar para não perder a ordenha gostosa nas tetas da mãe estadual.
Mas um dia o povo cansa e pode fazer tal a “Miss Segunda” com a coroa da “Miss Primeira” do Amazonas. Quem sabe!
O conceito de sustentabilidade significa o uso inteligente dos recursos ambientais, ou seja a exploração de forma que danifique o menos possível o equilíbrio do meio ambiente. Associado a isso, pode-se citar também, a questão de repor ao meio ambiente, aquilo que lhe foi tirado e assim gerar um ciclo onde, tanto o ambiente quanto o homem sejam beneficiados. Um exemplo disso é o reflorestamento.
Este conceito de Sustentabilidade também se aplica para todas as atividades como a agricultura, a extração vegetal, mineração, fabricação de papel, entre outras. As ideias para aplicação de práticas sustentáveis são uma saída para garantir que a utilização do meio ambiente gere um retorno favorável financeiramente e com poucos danos ambientais.
Vale lembrar também, que as ideias sustentáveis também se estendem para as indústrias urbanas que eliminam gases poluentes. Nesse caso, a questão é mais complexa, e exige estudos químicos aprimorados para se chegar à solução de “como poluir menos”. Algumas empresas desse setor já estão melhorando seus índices de poluição, e com isso, devolvendo a qualidade de vida à população circunvizinha.
O que se deve entender também é que no mundo de hoje não existe mais a possibilidade de extinguir as atividades humanas exploratórias, devido à todo avanço tecnológico etc. Bem como, deve-se entender também que não se pode ignorar a necessidade do consumo consciente do meio ambiente.
A economia de um país não funciona sem industrialização, mineração, agricultura, fábricas, etc. E para que isso dure por mais gerações é preciso compreender que ideias sustentáveis são fundamentais. O produtor tem que ser aliado do campo. A indústria tem que ser parceira da eliminação de resíduos e poluentes, assim garantindo a qualidade de vida.
Foto: (Ivan Raupp, Evelyn Rodrigues e Marcelo Russio – G1)
Na madrugada do último sábado para domingo, toda a nação das artes marciais, vibrou de admiração, respeito e contentamento. A volta do brasileiro Anderson Silva, várias vezes campeão, calou Las Vegas, Estados Unidos e o mundo que estavam em grande expectativa diante do evento. Todos queriam saber como se comportaria a lenda viva do UFC, após a longa temporada que passou em recuperação, depois de ter quebrado a perna na última luta.
Se adversário Nick Diaz, um lutador americano e polêmico, aguardava o adversário num momento que também poderia tornar-se celebridade. A madrugada, para os brasileiros torcedores no Brasil, parecia não ter fim antes do embate Anderson X Nick, diante de tantos preliminares e andanças dos ponteiros. É que em Las Vegas a arena ficou também lotada de brasileiros que pareciam sentir-se em casa, incentivando e vibrando com o campeão por sete vezes, Anderson Silva.
Não se podia esperar muito do “Aranha”, pela sua ausência por mais de um ano fora dos combates e o trauma causado pela parte física. Até mesmo o “Aranha” não sabia qual seria o seu próprio modo de agir diante de um adversário inusitado e provocativo. Anderson, entretanto, aos poucos foi adquirindo confiança e passou a ser a grande sensação da luta, sendo nitidamente superior e seguro.
Por tudo que Anderson havia passado, foi bastante compreensível que ele não partisse direto para liquidar o adversário, pois, pegar confiança era de fundamental importância para o “Aranha”. Silva não decepcionou a ninguém. Lutou seriamente, não caiu em armadilhas e foi crescendo na luta com muita classe e elegância pagando em dobro o que se esperava de um ex-campeão.
Para não se arriscar e botar tudo a perder, teve paciência o suficiente com o seu rival, levando a luta para a última rodada onde caiu ao chão em prantos de emoção por ter sido o vencedor do combate. E para o chão Anderson levou com ele milhões e milhões de brasileiros que tiveram a paciência recompensada em aguardar até alta madrugada.
Um início de fevereiro altamente favorável e emocionante para o planeta e, particularmente para o Brasil.
Com tantas notícias que nos envergonham lá fora e aqui, sobre o nosso estado, temos que ressaltar, quase como desabafo, o brilho de alvíssaras.
O anúncio concreto de instalação da 1º fábrica de equipamentos para energia solar do Brasil em Marechal Deodoro é motivo de comemoração sim. É preciso industrializar o estado diversificando seu parque fabril, escapar da monocultura canavieira e destacar-se no cenário brasileiro.
“As obras de construção da fábrica já foram iniciadas em uma área de 80 mil m² no Polo Industrial José Aprígio Vilela, em Marechal Deodoro. A fábrica vai gerar 100 empregos diretos. Após o início da produção e dos processos de instalação dos equipamentos, segundo o executivo da Pure Energy, Gelson Cerutti, a perspectiva é que até cinco mil empregos indiretos sejam gerados”.
Infelizmente nosso sertão vai contando nos dedos as fábricas instaladas em Murici, Maceió e Arapiraca e fica apenas conformado com galinhas e carneiros. Conformado porque não se vê um único movimento entre os prefeitos do semiárido que olham unicamente para o umbigo e o seus feudos calados como defuntos. Prefeito nenhum lança uma bandeira de industrializar o sertão, numa campanha séria e forte entre seus colegas e a bancada nula de deputados. Não trazem para seus respectivos municípios nem sequer uma fabriqueta de quebra-queixo. Se não são coronéis a quem só interessa o atraso, mas são filhotes da inércia, da acomodação, da vidinha corriqueira das bajulações, buchadas de bode e lapadas de aguardente nas chácaras dos compadres.
Sertão desgraçado, abandonado, acomodado, pessimamente dirigido, com o dedo indicador enroscado na reata da calça de cada gestor municipal. Sertão que ainda vive de esmola, onde a população é apenas massa, massa marroque, pão dormido de três dias, pisada e desprezada por lideranças dúbias, frágeis, enganosas, descompromissada com tudo que cheira a progresso, com raríssimas exceções.
As únicas indústrias que chegam ao sertão são as indústrias das drogas, da insegurança, dos crimes, da miséria, tudo gemendo debaixo da riqueza crescente dos espertos. A culpa não é dos governadores, mas dos próprios maus prefeitos que não gritam por sua gente, mas bocejam de tédio e roncam de destempero.
A sociedade civil organizada não reage e o legislativo só pensa em aumento de salário, mordomia e se exploda quem quiser.
Como pode apenas uma voz solitária como a nossa fazer alguma coisa? Onde estão os outros. Por certo em lugares alagadiços só com a cabeça de fora como cágado jabuti.
Aproximava um magnífico crepúsculo. O verão ditava suas ordens. A igrejinha, de muito grado, aceitou um último afago do sol. A coruja cruzando o céu emprestou-lhe um capucho de branco. Com seu grito de aguçar sentidos rasgou o ar dum canto a outro. Estilhaçado, semi entorpecido por alguns segundo, assim ficou o guache negro. Por um instante, muito acima de todas as cabeças, o céu experimentou o desmantelo. Cabeças de pensar, se punham a volver coisas do passado. Quão longe estavam os pensamentos, e o passado. Muito longe estavam.
Eram duras as ordens ditadas pelo verão. De rude beleza, ia revestindo o sertão, sua casa. As montanhas tal qual imensas senhoras gordas, desnudas, adormecidas. Tendo o colo alvibranco dos lagedos, o ventre de catingueira, e os pelos pubianos, verdejado de umbuzeiros e juazeiros. Deitadas languidamente em seus divãs posavam a um excêntrico artista, louco, incansável, senhor tempo. Tempo de velame e macambira, sedutores nubentes se amando. Pequenos lábios em flor se despetalando, hastes dilacerantes, desvirginando. O vento uivando, lascivamente a lamber as asas das poríferas mariposas, aturdidas de paixão. Não indo claro, além da aflição das almas. E se tudo nunca fora tão claro como parecia, por conta disso, algumas coisas eram dignas de existirem. O obséquio de ser no mundo – as coisas e os seres todos – com sofreguidão de existir e viver, viviam. O esforço desprendido pelos viventes para se manterem vivos, isso era uma das coisas dignas. E ia tudo se tornando tão obscuro, mas somente superficialmente. As nuvens que alaranjaram o alvorecer, já não eram as mesmas que avermelhavam o sol poente.
Felizmente a paz ainda era o que se almejava. Gafanhotos, grilos, aranhas, mosquitos, vaga-lumes e sapos. Nanos-habitantes suburbanos da sub-urbe. Civilização das quinas e esquinas, dos cantos de parede. Indo suas preocupações de cada dia. A dispensarem cuidados: será que vingariam o dia que ainda viria? Ora, seus futuros, só a Deus pertenciam. Não tinha como não lembrar de Mateus (6,24-33) “Por isso vos digo: Não vos inquieteis quanto à vossa vida, com o que haveis de comer ou beber, nem quanto ao vosso corpo, com o que haveis de vestir. Porventura não é a vida mais que o alimento, e o corpo mais que o vestido? Olhai as aves do céu: não semeiam nem ceifam nem recolhem em celeiros; e o vosso Pai celeste alimenta-as. Não valeis vós mais do que elas? Qual de vós, por mais que se preocupe, pode acrescentar um só côvado a duração de sua vida? Porque vos preocupais com o vestuário? Olhai os lírios do campo; mão trabalham nem fiam! Pois Eu vos digo: Nem Salomão em toda sua magnificência, se vestiu como qualquer deles. O vosso Pai celeste bem sabe que tendes necessidade de tudo isso. Procurai primeiro o Reino de Deus e a sua justiça, e tudo o mais se vos dará por acréscimo.”
Meninos brincavam no Largo. Ulisses lembrou de outros tempos. Coberto de barro vermelho, o largo nem sonhava com calçamento. Os fundilhos das calças ganhavam manchas avermelhadas. Lamparinas – a esguias estacas de madeira – faziam vezes de postes. Espaçados, abrigavam chumaços de estopa embebidos em gás óleo. Pipas coloridas lá em cima – cuidavam de enfeitar com outras cores, negra paisagem celestial – a se enroscarem aos próprios fios, os únicos existentes. As meninas com seus vestidos coloridos de mangas bufantes, de muitas anáguas. Tiaras e tranças, nos cabelos bem cuidados, sentadas nos bancos, sacudiam os pés de sapatinhos. Ostentavam bonecas de porcelana ricamente ornadas, tão assemelhadas a miniaturas de si. Um dos moleques que os colegas chamavam de Elias, em troca de bolas de gude, revistas e figurinhas, descia plantando bananeira, os degraus da igreja. Batista tinha os dois incisivos da frente escuros, careados. Usava o cabelo lambido no cocuruto – muito provável aquilo fosse brilhantina – vã tentativa de assentar a carapinha. Um cinto fino, gasto, sustinha suas calças folgadas, sapatos velhos nos pés. Batista sonhava um dia tornar-se artista de circo, malabarista ou quem sabe mágico. Manoel Filho o mais alto de todos, assim como a maioria deles, era menino do mato que viera pra cidade. Negro de lábios carnudos, os incisivos separados, olhos de grandes pupilas e as pálpebras caídas davam-lhe a impressão de estar sempre grogue, sonolento. Tinha orgulho de dizer que sabia carrear, aos seis anos conduzira o primeiro carro de boi. Como nenhum daqueles sabia das coisas do campo. E tinha ainda “Berruguinha” que por mais que Ulisses se esforçasse, não deu pra lembrar o verdadeiro nome do danado. Sua fisionomia, no entanto, vinha nítida, por completa, inclusive com a verruga no queixo que atribuíra o apelido, a muito custo aceito. Só os mais velhos podiam apelidar. “Berruguinha” era menino arteiro, cabra bom na arte de aprontar presepadas. Ele e Ciço de Tereza, daria uma parelha boa de cães, capazes de botar o diabo a correr do inferno.
Lembrou-se dum dia que iam pelo caminho do sítio – na volta da escola – danaram-se a correr. Começaram uma brincadeira do “pega”. Adentraram uma vereda. Ulisses que ia a dianteira não viu um colchete fechado – acabou se jogando contra os arames – cortou o rosto em três cantos. Ganhou uma cicatriz atrás da orelha. E quando estava muito pensativo – como agora – ficava passando o polegar com força a sentir o sulco. Lembrou-se da tia Iracema que quando era pequena também ganhou um latanho bem grande na barriga, porque teve que passar as pressas por baixo dum arame. No caso dela porem, teria sido quando seus avós fugiam de Lampião, isso foi lá pelos idos de 36, assim contavam os tios mais velhos. O pai de Manoel Filho,o negro Quincas era mascate, no meio da feira vendia pião de goiabeira, ponteira, faca peixeira, patuá, pedra-ume, cartucheira, apito de imitar “Fogo-apagô”. Aconselhava ter muito cuidado quando entrasse no mato. Cuidado com a sucuri quando fossem tomar banho no açude. Dizia: “-Elas costumam ficar pastorando e atacam justo na hora que sua caça vai beber água!… Uma vez uma Corre-Campo duma carreira que me deu, veio botar eu bem aqui no terreiro de casa!” A cobra Cipó facilmente é confundida com um galho, por isso, ao entrar na mata fechada, cuidado dobrado onde por a mão. Ciço jurava de mãos juntas que um dia viu um calango virando cobra. “-O bicho foi se esticando, esticando, daí caiu as mãozinhas, depois os pés, e pronto!” Negro Messias aproveitou o embalo pra contar que outro dia quando estava caçando rolinha, viu perto da beira do barreiro de Seu Manoel, “-Uma cobra cascavel que veio bem devagarinho, chegou assim numa moita, lançou o veneno numa folha e foi tomar água. Depois voltou e engoliu o veneno novamente.”
Negro Rosalvo tinha – assim como a maioria daqueles – na cara e no jeito, fortes evidências da descendência africana. Toda segunda-feira tinha a obrigação, de levar uma boiada do seu patrão, pro sítio Pai Mané, o gado ficava pastando por lá, até a quarta-feira quando era levado pra vender na feira. Quando chegava as margens do imenso açude, iam tomar água. Teve uma vez que uma jibóia enorme atacou um garrote. Rosalvo no seu instinto bravio, e de coragem, salvou o filhote de boi, matando a danada com uma faca. Tirou o couro, e da carne fez churrasco. Nesse dia a cachaça dos boiadeiros além do jabá teve mais um tira-gosto diferenciado. Uma cruz feita com dois pedaços de catingueira, na beira da estrada rodeada de pedras, assinalava o local onde o corpo do nosso amigo – vitimado por mãos assassinas – tombaria sem vida. Era uma quase noite quando ele vinha com o gado. Chovia uma dessas chuvas que encharcavam até os ossos, enquanto ribombavam trovões, chicoteavam relâmpagos. Era um gado pouco, mas eram cabeças selecionadas, os que vieram com ele naquele dia eram maus feitores, ladrões. Ainda encima do cavalo mesmo recebeu o tiro que varou-lhe o peito caiu na lama. E o mundo que já estava escuro foi ficando ainda mais treva. A última coisa que levou foi o cheiro bom de esterco nas ventas, a quentura do seu próprio sangue aquecendo suas mãos, e o mugido do gado assustado com o disparo, que foi ficando longe. Cada vez mais longe.
A moça continuava se aproximando. Ulisses fez com que seu olhar subisse pelas suas pernas, enquanto vinha caminhando. E subiu pelo ventre, pelo colo. Por fim chegou suas vistas ao rosto. Fixou os seus olhos nos olhos dela. Não era possível! Aquela que vinha bem ali em sua direção era sua irmã, Ritinha! Santa Luzia alumiadora dos olhos era testemunha do que o que ele via era verdade! Valei-me meu Deuzinho do céu! E as meninas dos olhos de Ulisses – tristes meninas – emprestaram-lhe ao rosto um arroio de lágrimas. Porque era tempo de chorar.
Os velhos carnavais de Santana do Ipanema têm seus registros mais antigos na década de vinte, através do escritor santanense Oscar Silva. Oscar comentava até com detalhes sobre alguns blocos masculinos e femininos e fala muito mais sobre o “Negras da Costa”, oriundo de Quebrangulo. O “Negras da Costa” daquela cidade Agrestina dançou várias vezes nos carnavais de Santana do Ipanema. Esta cidade, porém, inspirada na brincadeira de Quebrangulo fundou o seu bloco fazendo grande sucesso pelas ruas da cidade, tendo como brincantes, entre outros, os saudosos Zé Urbano e Filemon. Esse bloco formado de homens vestidos de branco, imitando baianas, roda e requebra pela cidade, numa cadência de causar inveja. Recentemente o bloco de “Negras da Costa” apresentou-se em Maceió, continuando com a mesma beleza impressionante dos carnavais da década de 20.
Entretanto, um dos blocos mais antigos e tradicionais de Santana é o do “Urso Preto” do malandro Zé Nogueira, Seu Caroula, Chico Paes e outros personagens que tornaram esse animal imorredouro nos tempos carnavalescos.
As histórias do bloco do urso e suas presepadas ainda hoje podem ser conhecidas nos bares e nas esquinas centrais da minha terra.
Estamos, porém, com mais de uma década de fracassos carnavalescos, muito embora haja muita propaganda. Os brincantes resolveram abandonar o torrão e partir para cidades como Pão de Açúcar e Piranhas, principalmente por causa do banho no rio São Francisco.
Existem, porém, os insistentes que teimam em brincar, independente de ajuda do poder municipal.
Esse ano, com a crise particular que aperta as goelas de Santana do Ipanema, nova machadada cai na cabeça dos foliões sem condições de nada.
E lá na Rua Delmiro Gouveia, no restaurante Zé de Pedro, um desses brincantes mais pobres, estava a se lamentar.
Foi ele mesmo quem disse que para tirar o prefeito da apatia, a solução era desenterrar uma cabeça de burro na entrada da cidade e sentar um urso preto, como totem nos degraus da prefeitura.
Alguém perguntou ao folião se isso resolvia.
Ele respondeu:
─ Se resolve mesmo, não sei, mas pelo menos é um fantasma a mais diante de quem tá dentro.
Sobre Clerisvaldo Chagas
Romancista, historiador, poeta, cronista. Escritor Símbolo do Sertão Alagoano.
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05 fev
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