VAMOS A PARICONHA

Igreja em Pariconha (Foto: Rádio Jornal Web)

Caso você deseje fazer um “tour” pela região serrana do Sertão alagoano, não esqueça Pariconha. O município fica distante da capital, sim. A cidade é a mais longínqua de Maceió, dentro dos seus 354 km, rumo ao extremo oeste. O município faz fronteira com Pernambuco diante do rio periódico Moxotó.

Pariconha foi emancipada de Água Branca, em 7 de abril de 1992, sendo seus cidadãos conhecidos como pariconhenses. O município começou a ser habitado no início do século XIX com fazenda de gado miúdo. O nome Pariconha tem origem num pé de ouricuzeiro que havia onde hoje é a sede. Seus frutos eram formados de duas partes chamadas “conhas”. Dizia-se: um par de conhas. Com o tempo veio à junção Pariconha.

Seu território pertence à Microrregião Serrana do Sertão Alagoano e tem como padroeiro o Sagrado Coração de Jesus, cujos festejos acontecem no mês de novembro. Ali chegou logo cedo um grupo de índios jeripancós – originários de Tacaratu, Pernambuco – e habitou a serra do Ouricuri, próxima da cidade.

Pariconha é um pequeno núcleo que se moderniza com seus 10.684 habitantes, numa altitude de 401 metros e um território de 260.858 k2.  Suas imediações são Delmiro Gouveia, Água Branca e Mata Grande.

Para quem gosta de narrações sobre cangaceiros, a região oferece boas histórias, pois, ainda como povoado, Pariconha sofreu duas ou três invasões por Virgolino Ferreira e asseclas, antes mesmo de se tornar conhecido como Lampião. (Lampião em Alagoas, do mesmo autor). Ali também atuou o pequeno bando dos Porcino, o qual Virgolino se enturmou quando seus pais vieram de Pernambuco para morar em Alagoas.

Rodar pelo Alto Sertão do estado, vai ficando cada vez mais fácil devido o asfalto por todos os lugares. A região serrana, além do clima diferenciado, oferece belas paisagens entre serras e vales verdejantes onde a vista se espraia. Saindo de Maceió a Pariconha a viagem pode ser através de Arapiraca, Batalha, Delmiro Gouveia ou através da BR-316, Palmeira dos Índios, Santana do Ipanema, entroncamento do povoado Carié.

Muitas novidades podem surpreender o homem da cidade grande, nessas turnês pelos sertões de B. Chagas. Vamos experimentar chegando à cidade do par de conhas.

Clerisvaldo B. Chagas, 21 de fevereiro de 2018

Crônica 1847 – Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Sobra intolerância e falta criatividade

Rivalidade as vezes sai dos gramados (Foto: André Luiz Oliveira Yanckous / Reprodução / Galeria Nikon)

Vários são os temas que nos levam a discussões. E é em algumas delas que a conversa salta de um simples diálogo tolerável, para insultos e acusações descabidas e sem noção.

Percebo que os debates mais acalorados estão sempre ligados a política, religião e futebol. Isso acaba seguindo o velho dito popular: “política, futebol e religião não se discute”.

Eu logo discordo. Todos os assuntos que nos interessa se discute. Uma discussão sadia, onde cada um deve respeitar a opinião do outro deve ser incentivada.

A minha discordância da sua opinião deverá ser respeitada. É ai onde entra outra frase bem propagada: “Posso não concordar com nenhuma das palavras que você disser, mas defenderei até a morte o direito de você dizê-las”.

Essa foi dedicada por muitos anos ao filósofo Voltaire, mas que, pesquisadores descobriram que a verdadeira autoria foi da escritora britânica Evelyn Beatrice Hall, que escreveu a biografia do francês.

Ou seja, durante anos, muitos acreditaram que a afirmação seria de Voltaire, quando não era. Daí, a importância de uma discussão ampla em qualquer assunto. A discussão nos instiga à pesquisa.

Ao invés de revide com violência, trago um exemplo de que a intolerância pode ser revertida em criatividade. O caso aconteceu na década de 1960, protagonizada pela torcida do Flamengo.

Torcidas rivais cariocas chamavam os rubro-negros de “urubus”, por se tratar de uma torcida formada por maioria afrodescendentes e pessoas de baixa renda.

É claro que os flamenguistas se sentiam ofendidos, no entanto, eles absorveram a provocação com irreverência, a partir de um fato inusitado. Quando a torcida rival levou um urubu ao Maracanã, para zombar do adversário, a ave passou a ser exaltada e transformada em mascote.

A minha própria vida tem uma história sadia em relação a rivalidade no futebol. Eu flamenguista e o meu amigo Mário Pacífico, vascaíno, por várias vezes saímos pelas ruas da cidade com uma charanga, onde cabiam as duas bandeiras, rubro-negra e cruzmaltina.

Independentemente de quem fosse o vencedor, nós sempre nos confraternizamos. E, até hoje, passados oito lustres, continuamos nos respeitando: ele defendendo a suas ideias e eu as minhas.

Já está na hora de pararmos para uma profunda reflexão. E o começo de tudo isto está dentro de nós mesmo.

Por vivermos numa comunidade de maioria cristã trago um trecho do Evangelho de Matheus, 7:3, nele, Jesus nos dá um excelente exemplo de como começar a ser tolerante: “Por que vês tu o argueiro no olho de teu irmão, porém não reparas na trave que está no teu próprio?”.

MARACANÃ

Antiga Churrascaria Maracanã (Foto: Clerisvaldo B. Chagas)

Maracanã é o ponto de referência mais falado de Santana do Ipanema, Alagoas. Trata-se de um largo no centro do gigante Bairro Camoxinga, cortado pela BR-316. É ponto de convergência e divergência de sete ruas e possui um dinâmico comércio miúdo sendo o segundo da cidade.

No Largo do Maracanã e adjacências, você encontra posto de gasolina, padarias, casas de lanches, funerária, oficinas de motos, mercadinhos, farmácia, barbearia, casa de móveis e uma flutuante movimentação em ponto de transportes para municípios do oeste como Poço das Trincheiras, Maravilha, Canapi, Ouro Branco e para todas as outras do Alto Sertão alagoano.

Outrora fora lugar tão perigoso que certo delegado chegou a comentar: “Entre dez ocorrências policiais, oito são do tal Maracanã”.

No livro ainda inédito “O boi, a bota e batina, história completa de Santana do Ipanema”, o autor detalha a origem do nome Maracanã e que raríssimas pessoas conhecem. E os que conhecem não vão além de uma churrascaria que havia no local e que ostentava a denominação do maior estádio do mundo.

Mas o livro também traz os detalhes de origens de todos os bairros e pontos de referências da cidade. É o maior documentário jamais produzido no Sertão Alagoano, que ainda não foi publicado por falta de patrocínio. E as autoridades que têm verba para isso, fazem ouvidos de mercador e, o santanense fica sem sua história completa e verdadeira, porque políticos odeiam intelectuais. 

O prédio que deu origem a Churrascaria Maracanã, ainda continua de pé. Foi churrascaria, dormitório, bar, restaurante, pequena mercearia, tudo sob comando do proprietário conhecido como Seu Neguinho. Sem atividade que valha à pena, o edifício se deteriora com dificuldade de venda e os passos implacáveis do tempo.

Sua importância como valor histórico é grande para o centro do bairro que o acolheu, mas nada parece evitar o futuro que o aguarda assim como a casa do padre Bulhões, o Fomento Agrícola, a igreja de São João, o Colégio Santo Alberto Magno, a Pracinha Emílio de Maia e outros importantes e fundamentais pontos santanenses.

Em tempos de campanhas políticas, o Largo do Maracanã torna-se o ponto mais importante para discursos. Coitado! Sem anel rodoviário e abandonado à própria sorte, torna-se o lugar mais perigoso do trânsito da cidade.

Clerisvaldo B. Chagas, 20 de fevereiro de 2018

Crônica 1.846 – Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

SIM À MOCOCA, NÃO À MACACOA

Foto: Divulgação

Aos oito anos vivendo por uns tempos em Maceió, já ouvia a propaganda agradável que me chamava atenção: “A vaquinha Mococa está falando/a vaquinha Mococa está dizendo/beba leite em pó Mococa…” E um mugido longo e saudoso de sertão fechava a propaganda: “moooon…”.

Minha tia, Carminha Braga, sempre comprava o leite em pó que vinha com uma vaquinha simpática desenhada no pacote. E como vai bastante tempo, pensei até que não existisse mais a marca. Olha a surpresa! Estava escrito na notícia: “Unidade da Mococa fechou e deixou 157 desempregados no interior de São Paulo”. Corri os olhos na Folha e vi que era mesmo a Mococa do meu tempo de criança.

O lado ruim ficou para o município paulista de Cerqueira César, onde a Mococa possui uma unidade de produção de leite UHT. A unidade foi fechada no último dia 6, deixando de produzir 500.000 litros de leite longa vida por dia. A sede da empresa é na cidade de Mococa, onde tudo começou em 1919, produzindo manteiga artesanal. Em 1930 já produzia em escala de indústria.

Entretanto, a unidade de Cerqueira César será vendida e, produtores de leite já estão fornecendo para outras marcas implantadas na mesma cidade. A empresa, por questões estratégicas, quer migrar para outros segmentos de derivados lácteos, terceirizando e produzindo achocolatados. Essa parte ruim é o problemão que a empresa deixa para seus fornecedores, desempregados e a circulação do dinheiro em Cerqueira César.  

O lado bom é que essa indústria estará funcionando dentro de poucos meses em Alagoas, produzindo achocolatado. Não sabemos como a Mococa foi atraída para essas bandas, provavelmente pela política de governo em trazer mais indústrias com incentivos para o nosso território.

Como já existem dois gigantes do leite e derivados em Alagoas (Palmeira dos Índios e Batalha) vem à indagação onde será implantada a Mococa. Tão bom que fosse em Santana do Ipanema, mas nem sonhando! As autoridades nunca deixaram que fosse implantada em Santana sequer uma fábrica de quebra-queixo. Mesmo assim, seja onde for, sendo em Alagoas já está de bom tamanho.

É o leite Mococa da minha infância. Bom, muito bom.

Clerisvaldo B. Chagas, 19 de fevereiro de 2018

Crônica 1.845 – Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Intervenção Federal, uma medida paliativa

Foto: Tomaz Silva / Agência Brasil

Instituída como uma medida excepcional, a Intervenção Federal foi decretada após ser estabelecida uma grave crise na segurança pública do estado do Rio de Janeiro.

Agora, a medida será submetida à apreciação e votação pelo Congresso Nacional e tem como fundamento principal o restabelecimento da ordem pública.

No último dia 16 de fevereiro o Presidente Michel Temer decretou a Intervenção no estado do Rio de Janeiro pelas Forças Federais visando o restabelecimento e a garantia da Ordem Pública. Apesar de ser uma medida extrema, a mesma está prevista na Carta Constitucional de 1988, a qual estabelece que a União não intervirá nos Estados nem no Distrito Federal, exceto, dentre outras necessidades, para pôr termo a grave comprometimento da ordem pública.

A medida ora adotada pelo Presidente da República, evidencia a incapacidade do atual governo de gerir a Segurança Pública do estado, que sofre com a grave crise institucional. Pelo Decreto, o General Walter Souza Braga Netto, foi nomeado e deve assumir como interventor nos poderes das polícias Militar e Civil, do Corpo de Bombeiros, das áreas de inteligência e ainda do sistema carcerário do estado, até que se restabeleça a ordem pública.

Essa é a primeira vez, desde a promulgação da Constituição de 1988, que um Presidente estabelece uma medida como essa. Porém, para se tornar válido, o Decreto que estabelece a Intervenção Federal deverá ser submetido à apreciação  e votação do Congresso Nacional ou da Assembleia Legislativa do Estado, no prazo de 24 horas, nos termos da Constituição.

Apesar de importante e necessária no presente cenário do estado do Rio de Janeiro, a Intervenção Federal deve ser encarada como uma medida paliativa que deve amenizar a grave crise estabelecida na segurança pública, isso enquanto permanecer a Intervenção.

O problema da violência é crônico e está inserido no contexto social, não só no estado Rio de Janeiro, mas também no Brasil de uma forma geral que submerge em um caos político, econômico e social, nas mais diversas áreas dos setores públicas, principalmente na segurança.

A RELAÇÃO ENTRE A INTERVENÇÃO FEDERAL NO RIO DE JANEIRO E A REFORMA DA PREVIDÊNCIA SOCIAL

Como já é do conhecimento de todos, tramita no Congresso Nacional a Reforma da Previdência Social. Para que haja a aprovação da mesma, a legislação pátria prevê a necessidade de Emenda ao texto constitucional e para isso o Presidente da República e seus aliados ainda buscam votos para sua aceitação.

Ocorre que com a aprovação do Decreto que institui a Intervenção Federal no estado do Rio de Janeiro, a Constituição Federal, em seu artigo 60, parágrafo 1°, veda a possibilidade de Emenda à Carta Maior enquanto perdurar a Intervenção.

Nesse sentido fica inviabilizada a Reforma da Previdência ou qualquer outro projeto que vise Emendar a Constituição Federal do Brasil, pelo menos até o dia 31 de dezembro de 2018, prazo de vigência do referido Decreto.

O CRUZEIRO

Primeira capa da revista O Cruzeiro (Foto: Divulgação)

Estamos em torno dos 41 anos do fechamento da revista de circulação nacional, O Cruzeiro. Foi uma revista de grandes reportagens e alto padrão lançada no Rio de Janeiro em 10 de novembro de 1928 e perdurou até 1975. Era editada pelos Diários Associados, de Assis Chateaubriand. Em 1960 recebeu novo design editorial que ficou conhecido como “bossa nova”.

A revista O Cruzeiro foi a principal revista ilustrada brasileira. Com inovações gráficas, publicações de grandes reportagens com ênfase ao fotojornalismo, estabeleceu linguagem nova na imprensa do Brasil. Reportagens de grande repercussão surgiram em parceria com a dupla repórter-fotográfico, sendo a mais famosa a formada por David Nasser e Jean Manzonque, anos 40 e 50.

O Cruzeiro falava dos astros de Hollywood, cinema, esportes e saúde e ainda divertia com charges, culinária e moda. Foram feitas reportagens como Lampião, Floro Novais, entrevistas com cangaceiros e cangaceiras e cobertura do suicídio de Getúlio. Chegou a atingir uma tiragem de 720.000 exemplares, quando a maior fora 80.000.

Dizem que nos anos 60, O Cruzeiro entrou em declínio por má gestão, sem o uso de suas fórmulas e o surgimento de novas publicações como as revistas Manchete e Fatos e Fotos. O ano de 1975 marcou a consagração da televisão e o declínio dos Diários Associados. Claro que todo veículo de comunicação tem sua tendência, sendo assim também com esta revista.

Nos anos 60, apesar de gostamos de gibis, como Tarzan, Kid Colt, O Fantasma e outros, aguardávamos também O Cruzeiro, para olharmos na última página, a charge do Amigo da Onça. As revistas chegavam para Dona Maria, esposa do alfaiate, Seu Quinca, à Rua Nilo Peçanha (Rua da Cadeia Velha). Dava gosto receber tantas revistas cheirosas das gráficas brasileiras. Muitas vezes quando as revistas chegavam, já estávamos aguardando na casa de Dona Maria, que era uma pessoa paciente e agradável.

A polêmica da estátua em homenagem ao jumento e seu tangedor, em Santana do Ipanema, foi mote desta revista em longa reportagem falando dos dois lados da questão, entre o prefeito da época e o vereador Everaldo Noya.

Que lembranças da qualidade em comunicações!

Clerisvaldo B. Chagas, 16 de fevereiro de 2018

Crônica 1.844 – Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

FAZENDO MOSAICO

Mosaicos (Foto: Gazeta do Povo))

O piso das casas de Santana, após o uso do cimento, entrou em um tipo de moda muito interessante. Pessoas mais abastadas da cidade começaram a usar, em lugar do cimento comum, ladrilhos chamados mosaicos. O mosaico era um pequeno bloco de cimento e outras misturas, de aproximadamente 20 cm2. Era grosso com superfície polida, continha variadas cores e desenhos criativos.

Com a moda em expansão, principalmente pelo efeito positivo e belo em salões e residências, foi implantada uma fábrica em Santana do Ipanema. Por pequena que fosse a unidade, mas representava um passo no modernismo, no progresso e economia local.

Conhecida como “A fábrica de mosaicos”, estava situada no Bairro São Pedro e pertencia ao cidadão denominado Zezito Tenório (o mesmo que cedeu a maior parte das terras para o atual Bairro São José). Foi de grande valia essa fábrica que fez a evolução do conforto caseiro, criou empregos e movimentou o comércio da construção.

Não sabemos as razões, mas a fábrica de Zezito Tenório cerrou as suas portas. Ainda hoje o lugar é marcado com uma parede em preto, nas proximidades da Biblioteca Municipal Adercina Limeira.

Com a evolução dos tempos, o mosaico foi substituído pelo chamado “piso”, mais fino e mais polido, feito de argila cozida. O mosaico era encerado nas residências, formando um brilho muito bonito e chamativo. O piso de hoje já chega com o brilho de fábrica e alguns são até vitrificados. Portanto, a fábrica de mosaicos de Zezito Tenório, foi também ponto de referência tanto do Bairro São Pedro, quanto da cidade.

E foi assim que no chavão de “bater às portas”, desapareceram conquistas que representavam os passos para frente como fabriquetas de calçados, aguardente, refrigerante, colorau, vinagre, móveis, cordas, colchões, sola e outras que não encontraram respaldo das autoridades. A cidade perdeu todo seu processo nascente de industrialização.

Há pouco ainda havia várias casas em Santana do Ipanema, ostentando os charmosos blocos de mosaicos da fábrica de Zezito. Foi em palestra na Biblioteca Adercina Limeira que historiei por completo o Bairro São Pedro e sua importância no desenvolvimento de Santana do Ipanema, para os alunos da Escola Líder. 

Acho que não existe nenhuma pedra de mosaico em exposição no Museu Darras Noya.

Clerisvaldo B. Chagas, 15 de fevereiro de 2018

Crônica 1.843 – Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Carnaval tradicional de Santana: eu fiz parte desta história

“Mexicanos” usavam carroça para percorrer as ruas de Santana (Foto: Cortesia / Cristóvão Ferreira)

Durante 10 anos consecutivos, eu e um grupo de amigos saímos pelas ruas de Santana do Ipanema, durante o período carnavalesco, com o bloco “Os Mexicanos”.

O ano era 1978, e o primeiro a encarar a brincadeira comigo foi o advogado Paulo Fernando Oliveira. Depois vieram o empresário Cristóvão Ferreira e o jornalista José Malta, além dos músicos Índio e José Djalma.

A ideia era se fantasiar de tradicionais mexicanos, com sombreiro e poncho. O motivo da homenagem aos irmãos latinos era a vitoria da seleção brasileira na Copa de 1970, no México. Na época os donos da casa se mostraram imensamente simpáticos a equipe brasileira.

Foram 10 anos de pura alegria e muita animação. Durante o dia a gente visitava as residências de pessoa conhecidas (costume da época). Parte da noite a gente se divertia na Maratona (nome dedicado à folia da praça), com animação da Orquestra de Frevo do Maestro Miguel Bulhões, a qual eu tive a grata satisfação de tocar tarol por dois anos.

Depois da meia noite chegava hora de se divertir no baile do Tênis Clube Santanense, sempre embalado por uma excelente orquestra de frevo, que também tocava músicas de sucessos do momento.

A aquisição dos trajes para o bloco se dava a partir do nosso salário, passando por uma rápida arrecadação no comércio local, que nunca se furtou a colaborar.

Nós fomos o primeiro bloco carnavalesco de Santana do Ipanema a confeccionar uma camiseta com a marca do bloco. A ideia não era se vestir com a camiseta, mas vender para arrecadar fundos para pagar as nossas despesas.

Camisas eram confeccionadas para ajudar no bloco (Foto: Cortesia / Sergio Campos)

No ano seguinte às vendas das camisetas (diga-se de passagem, um sucesso), mandamos confeccionar o primeiro adesivo de um bloco carnavalesco, em nossa cidade. Tanto a camisa, quanto o adesivo foram feitos por Adeilson Dantas, pioneiro no serviço de serigrafia no Sertão.

Trinta anos se passaram desde a última vez que “Os Mexicanos” saíram pelas ruas de Santana do Ipanema para animar o Carnaval. Fica em nossa memória os bons tempos em que colaborávamos para que esta festa fosse realmente um movimento popular em nossa cidade.

No entanto, não éramos os únicos a fazer esta festa ficar animada e sustentar a tradição mais popular do Brasil. Contávamos com muitos blocos tradicionais, que há algum tempo não vimos mais pelas ruas de nossa cidade.

Recordamos de alguns deles: Os Cangaceiros, Bumba-Meu-Boi, Bloco do Urso Preto, Bloco do Urso Branco, Intimidade Com a Sogra, Bloco do Sapo, As Pastorinhas, Os Magnatas, SWAT, Os T Arados, As Damas de Ouro, BrasilGas, Bloco do Passarinho, Pau d’Arco, Bloco Taxi, Os Piratas, As Pecinhas, Pitú Kom Limão,  Os Cãos, Bloco O Firminão.

Essa história a gente conta para que a nova geração saiba que Santana do Ipanema já teve um bom e animado Carnaval de rua, onde prevalecia a manifestação popular.

OS BALÕES DE SENHORA SANTA ANA

Caminhão: lugar exato da soltura dos balões (Foto: Domínio Público)

Não posso dizer com certeza se as festas de padroeiros e padroeiras do Sertão de Alagoas eram todas iguais. Contudo, nos novenários à Senhora Santa Ana, sempre havia banda de música que tocava fora e dentro da Matriz. Havia ainda o foguetório que saía do Beco de São Sebastião e o “carro de fogo” que navegava com velocidade num arame estendido defronte a Igreja.

Com fogos também era descerrada a imagem da santa que ficava enrolada num mastro de madeira. O fogo ia subindo e desenrolava a imagem sob aplausos da multidão. A parte dos fogos tinha os fogueteiros profissionais responsáveis que vieram de muito antes do meu tempo e que, praticamente, foi encerrada com o “Zuza Fogueteiro”. O Zuza, gordinho, alto, branco e simpático, morou por último no final da Rua Tertuliano Nepomuceno, centro de Santana do Ipanema.

O balão tradicional não faltava. Era manipulado e solto por trás do hoje extinto, “sobrado do meio da rua”, precisamente por trás da última casa comercial, “A Triunfante”, de José e depois Manoel Constantino. O papel delicado quase sempre tinha as cores azul e branca. Habitualmente o balão ia aos céus durante a celebração da novena.

Formava-se uma pequena torcida ali no ponto do balão, onde estava armada a “onda” e o “curre” (carrossel). É que precisava muita habilidade dos encarregados para desdobrar o balão, esticá-lo, por fogo sem queimar suas paredes, erguê-lo no ar e aprumá-lo para a subida triunfante sob palmas e gritos de triunfo.

Havia profissionais para tudo, na cidade: fogueteiro, ferreiro, flandreleiro, retelhador, sapateiro, barbeiro, amolador… Mas nunca me foi dito quem era o artista dos balões. Só poderia ter sido uma pessoa de muitas nuances e amor no coração para confeccionar uma coisa tão mimosa, frágil e bela.

E lá ia aquele artefato se equilibrando no ar, subindo, subindo, subindo… E a luz segura do seu bojo ia ficando cada vez mais longe e se apequenando até tornar-se apenas um pontinho luminoso misturado com as estrelas no céu profundamente azul.

Havia ainda o leilão. Mas aí era outra coisa. Quem seria o artista dos balões? Saudade.

Clerisvaldo B. Chagas, 9 de fevereiro de 2018

Crônica 1.842 – Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

PAGINANDO OS CARNAVAIS

Bacalhau do Batata (Foto: G1)

Siloé Tavares – o deputado estadual santanense – estivera no comando do combate violento do Impeachment do governador Muniz Falcão. Mudando da violência para cena doce, o deputado compadre de meu pai, construiu com festas todos os dias, a segunda igrejinha do serrote do Cruzeiro. (O boi, a bota e a batina, história completa de Santana do Ipanema).

Não era de se esperar que um homem sério e rouco fosse capaz de brincar o Carnaval. Mas estava ali no meio da rua para quem quisesse ver. Siloé e seus amigos foliões fundaram o “Bloco do Bacalhau”. A turma tinha um estandarte onde um bacalhau centralizava ladeado por recipientes de vinagre e azeite. E se havia mais de uma estrofe na música do bloco, não foi registrada. Mas o mote de guerra era repetido infinitas vezes:

“Olha o bacalhau

Pra nós é um colosso

Azeite com vinagre

Salgado ou insosso…”

Este conjunto de folia, anos 60, foi apenas mais um dos tantos e tantos blocos carnavalescos da minha terra, descritos desde a década de 1920.   Quando o bloco era organizado, listava casa de pessoas influentes, para visitá-las durante o trajeto das ruas.

Essas pessoas preveniam-se e aguardavam a passagem do bloco com espaço, bebidas e tira-gosto. Antes dos anos 20, os foliões costumavam invadir o sobrado do coronel Manoel Rodrigues da Rocha e dançavam no salão principal do casarão. Depois, a casa do padre Bulhões também era muito visitada onde o tira-gosto era pão de ló.

Os carnavais, tanto no interior do Brasil, quanto nas capitais, ora se apagam, ora se acendem. Mas tanto os fracos quanto os fortes movimentos de Momo, trazem suas histórias coloridas como suas roupas e estandartes. Quem gosta da folia, vai recordando suas aventuras repetidas a cada mês de fevereiro, ocupando a mente com suas fantasias.

Em Santana do Ipanema, cada um que conte as piruetas e os amores dos antigos carnavais, aumentando aqui, esticando mais ali, na ressurreição de foliões como Seu Carola (ô), Silóe, Nozinho (ô), Lucena, Chico Paes, Agenor e muitos outros que ficaram famosos na cidade. Sei lá…

“Olha o bacalhau

Pra nós é um colosso

Azeite com vinagre

Salgado ou insosso…”

Clerisvaldo B. Chagas, 8 de fevereiro de 2018

Crônica 1.841 – Escritor Símbolo do Sertão Alagoano