Sobre Clerisvaldo Chagas

Romancista, historiador, poeta, cronista. Escritor Símbolo do Sertão Alagoano.


ZÉ CHAGAS E OS CAIXÕES DE DEFUNTO

25 Maio 2018


Cartas (Foto: Domínio Público)

Já abordamos este assunto. Animando as cidades do interior, nunca faltam alguns gaiatos nas comunidades. Em Santana do Ipanema, o individuo Zé Chagas alegrava o ambiente quando chegava trazendo sua verve para brincadeiras. E se tivesse tido antes de falecer, a ideia de andar com um pajem para anotar os seus feitos, por certo teria publicado um livro humorístico de muitas e muitas páginas. Explorava casas de jogatina e, por ter um gogó acentuado, parecia um urubu.

Foi lá no Beco de São Sebastião, na casa da esquina, cujo prédio já tinha sido muitas coisas e naquele momento abrigava o baralho. Nós, os meninos, brincávamos zoadentos sobre uma janela com meia tala, numa noite de festa de Senhora Santa Ana, a padroeira. Fui um dos atingidos por um balde d’água jogado pela janela. Havia sido jogado por Zé Chagas, o comandante da casa.

Já rapaz feito, vi sentado à porta fechada da nossa loja, dois negros altos conversando baixo: Filemon, ex-cangaceiro e Zé Preto, o manganheiro que construiu um oratório na croa da pedra do sapo, no rio Ipanema. Para todos os mortais, nada. Mas para Zé Chagas que vai passando, lembra um pássaro preto do sertão e exclama com toda maledicência: “Espia onde está um casal de anum”, e aponta para ambos.

E quando um amigo indaga a outro se acha Zé Chagas muito feio, o cabra responde: “Eu só não acho porque já me acostumei com ele”.

Assim chegou a cartomante Maria Galega, oferecendo seus préstimos e deitou cartas para Zé Chagas, quando abriu a sessão: “Estou vendo ouro na sua vida”. E o gaiato respondeu na bucha: “Só se for ‘ourina’, Maria”.

Quando o dono da casa de caixões de defuntos quis dá uma saidinha, pediu a Zé Chagas que tomasse conta que “ele chegaria já”. E Chagas, que atuava defronte com a casa de jogo “O Bafo da Onça”, prontificou-se em atender ao amigo. Eis que chegam pai e filho para comprar um caixão. Vão perguntando o preço e Zé Chagas dizendo. De repente o viúvo indaga se ele faz um preço menor no ataúde. Zé Chagas não mede consequência e liberta sua verve gaiata: “Só faço menor preço se o amigo levar dois”.

E o primo “véi” só não levou uma surra das maiores por causa da turma do deixa disso.

Deve estar brincando por aí, na outra dimensão.

Clerisvaldo B. Chagas, 25 de maio de 2018

Crônica 1.909 – Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

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