Mãos que criam arte: o legado cultural do Mestre Antônio de Dedé Da arte de esculpir a madeira à preservação da identidade cultural, a família Dedé mantém vivo o legado da arte popular que o pai, mestre Antônio de Dedé, deixou para a comunidade alagoana.

João Brito (sob supervisão) / Ascom Secult

23 jul 2024 - 16:00


Foto: Artesol / Cortesia

Da arte de esculpir a madeira à preservação da identidade cultural, a família Dedé mantém vivo o legado da arte popular que o pai, mestre Antônio de Dedé, deixou para a comunidade alagoana. Os seus filhos que herdaram o talento do pai, colocam toda a sua criatividade em cada obra feita na madeira que consequentemente são apresentadas ao mundo.

No ateliê localizado no agreste alagoano, em Lagoa da Canoa, a mágica acontece, pouco a pouco as obras vão tomando vida e identidade. Com vários tamanhos e formatos, as peças ganham destaque pela forte característica de cartum, expressa com traços faciais como olhos, bocas e dentes. A criatividade é um dos fatores que prevalece no momento da criação e cada filho do mestre Antônio retrata a sua individualidade criativa.

Seguindo os caminhos que o pai abriu, Antônio José de Dedé, um dos filhos, entre os nove, continua com o ofício do pai e transformou o talento da escultura em madeira em sua profissão. Com toda a sua dedicação e fidelidade ao talento herdado, o escultor e artista popular deixou a agricultura de lado e junto aos seus irmãos produzem peças que fortalecem o dom artístico.

“A partir da arte religiosa, cada obra tem um significado e uma representação da memória religiosa popular. Tudo tem uma história, e sem ela o mundo não seria mundo. E assim a arte em escultura tem uma importante contribuição para a preservação dessa memória. Seja em tela ou em madeira, tudo tem uma importância para as pessoas conhecerem a tradição cultural de um povo”, disse o artesão, Antônio José de Dedé.

Cada peça produzida tem uma identidade e uma personalidade. Colocar a arte na madeira não é fácil, mas os filhos fazem questão em manter viva essa habilidade que foi passada de geração em geração. Primeiro pelo avô, que em seu tempo livre fazia carros de boi, depois pelo pai e hoje a geração dos filhos do mestre Antônio ensina o legado para os seus filhos.

Rompendo as barreiras locais, o mestre Antônio conseguiu levar a sua cultura para outros lugares e assim foi apresentando a sua arte para o mundo. Enquanto o mestre esculpia as suas obras inspirado em imagens religiosas e nas coisas que via, o seu filho Antônio José retrata em suas peças a cultura quilombola e a intensa religiosidade do povo nordestino.

“A inspiração das peças é algo natural, acredito muito no dom que Deus me concedeu e assim o talento em expressar a minha criatividade em cada peça esculpida na madeira, representando muitas vezes aspectos da religião”, disse Antônio José de Dedé.

Rompendo fronteiras

A beleza das peças encanta a todos por onde chega. Em toda Lagoa da Canoa, o trabalho artesanal do mestre Antônio de Dedé já era bastante conhecido. Ainda em vida, o mestre Antônio de Dedé disse que foi descoberto duas vezes, a primeira aconteceu após a visita de um galerista ao seu ateliê e consequentemente resultou na venda e um contrato de exclusividade das peças. Porém, esse acordo só durou alguns meses.

Já a segunda ocorreu com a visita da proprietária da galeria Karandash, Maria Amélia, localizada em Maceió.  A profissional ficou encantada com a delicadeza das peças e em conversa fechou uma parceria com o mestre do Patrimônio Vivo, convencendo-o assim a explorar outras formas de expressar a sua criatividade nas peças. Esse estímulo acabou impulsionando a direção criativa do mestre e as peças começaram a ganhar outros formatos.

Como o talento não se limita, com o mestre Antônio não seria diferente. Após a visita de Maria Amélia, as peças do mestre começaram a ganhar outros ares e assim a ficarem mais conhecidas no estado. A temática religiosa foi sendo projetada cada vez mais e assim conseguiu romper as barreiras do interior de Alagoas e dessa maneira conquistou espaço no mercado de arte cultural a nível internacional.

Recentemente, as peças de Antônio José de Dedé chegaram às telas da novela “No Rancho Fundo”, exibida pela Rede Globo. A peça, denominada “Virgem Maria com o Menino Jesus”, ganhou destaque em uma das cenas da novela das 18h e proporcionou uma valorização ao trabalho artesanal do escultor alagoano.

Nas redes sociais, alguns internautas teceram elogios à família por continuar com o legado deixado por mestre Antônio.

“É maravilhoso ver esse destaque, a família continuar com o legado de Antônio de Dedé. Parabéns Antônio, você é um grande escultor”, comentou a empreendedora Joelma.

Mestre Antônio de Dedé

Antônio Alves dos Santos, mas conhecido como Antônio de Dedé, foi um artesão alagoano, residente do município de Lagoa da Canoa. Seguindo o mesmo ofício do pai, era agricultor e aos poucos deu lugar ao seu talento como escultor da arte em madeira.

Após ter o seu talento descoberto por admiradores da arte, foi reconhecido como fazedor de arte popular. Assim, as suas peças, desde os carrinhos até o retrato de pessoas, ganharam o gosto popular e foram rompendo as fronteiras dos municípios alagoanos.

Em 2015, após ter a sua contribuição cultural popular reconhecida pelo Estado, recebeu o título de Patrimônio Vivo de Alagoas pela Secretaria de Estado da Cultura e Economia Criativa (Secult).

“Depois que eu me tornei Patrimônio Vivo, a minha vida melhorou mais. É um dom que Deus dá para a gente sobreviver. É uma tradição da gente aqui, cada um tem um dom que Deus dá. Nunca podemos perder a fé, nem a esperança”, disse o mestre em entrevista após receber o seu título em 2015.

O objetivo do Registro do Patrimônio Vivo é preservar a memória cultural e garantir a transmissão dos saberes e fazeres artísticos e culturais de Alagoas. Cada mestre e mestra compartilha os seus conhecimentos com a comunidade, assegurando que as raízes culturais continuem a desenvolver-se e a inspirar a população.

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