Sobre Clerisvaldo Chagas

Romancista, historiador, poeta, cronista. Escritor Símbolo do Sertão Alagoano.


IPANEMA, GERSON E A BOLA

12 julho 2018


Coraça (Foto: Luciano Deppa)

Há muito falamos sobre o tema acima. Todavia, com a preocupação de se mostrar a bola da copa por dentro, nas redes sociais, voltamos ao título. As primeiras bolas utilizadas pelo nosso Ipanema, em Santana, era chamada de couraça. Era uma bola artesanal de couro com abertura costurada, após a colocação de câmara de ar. Era marrom, cor do próprio couro e, no mundo inteiro era assim. Em tempo de chuvas pesava que era um horror. Raríssimo era encontrar artesão para fazer uma couraça. A sua confecção era tão difícil quanto o alfaiate fazer uma batina. Raramente qualquer time tinha mais de duas couraças, o que atrasava em muito as partidas por diversas situações. Somente a partir dos anos 1950, as bolas no mundo começaram a melhora e a evolução até hoje.

Em Santana, conhecemos o Gerson Sapateiro, que diziam que ele jogara no time Ipanema. Como rapazote, víamos Gerson diante da sua tenda na minha Rua, Antônio Tavares. Moreno, alto e gordo. Tinha ótima clientela, mas estava sempre amargurado. Era casada com excelente senhora, parecem-no de nome Dalva ou semelhante, filha de Zé Cambão e Regina Cambão, que prestavam serviços à comunidade e amados por todos. Gerson era um cantor voz de ouro, verdadeiro uirapuru. Dezenas de pessoas pagariam seja lá quanto fosse para ouvir as melodias com o ex-Ipanema. Mas o sapateiro – sempre traumatizado com alguma coisa que só ele sabia – apenas cantava quando queria, assim mesmo durante o trabalho, quando não havia ninguém por perto. (Mário Nambu, único, que cantava as músicas de Augusto Calheiros, também agia assim).

Gerson morava vizinho a outro grande cantor santanense, conhecido como Cícero de Mariquinha (sua mãe). Gostávamos imensamente de todos. Foi uma honra enorme termos vividos no tempo do trio. Gerson, um dos nossos heróis, trabalhava sempre sem camisa. Mas como um adolescente ousaria indagar do cantor/sapateiro sobre seus desgostos! Cada sapato para conserto era uma esperança secreta de que melodia fugaz pudesse escapar da garganta do uirapuru.

Rua Antônio Tavares, rua repleta de heróis que ficaram no anonimato.

Clerisvaldo B. Chagas, 12 de julho de 2018

Crônica 1.940 – Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

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