Sobre Djessyka Silva

Djessyka Silva é servidora pública, atuando como Educadora Social em Santana do Ipanema. Bailarina e amante de todas as artes. É Assistente Social e graduanda em Ciências Biológicas pela Uneal


HOMENS, DESARMEM-SE!

6 novembro 2019


Foto: Rawpixel / Pixabay

Há muito tempo venho pensando nas mais diversas formas de falar sobre esse tema tão complexo, e ao mesmo tempo, tão peculiar que é o universo masculino. Alguns podem enxergar isso como leve audácia, ou pura travessura minha, querer falar destes seres vindos de Marte, sendo eu, mais um fragmento mandado de Vênus. Mas, enxergo o público masculino como uma ampla corporação que, assim como todas as outras “categorias” que um povo se deixa subdividir, também precisa de atenção. No entanto, por uma enorme (e cruel) soma de aculturações, eles são estatisticamente os que menos recebem cuidados.

Percebo o quanto a sociedade é cruel quando a visualizo sendo refém de seus próprios pré-requisitos para viver dentro de uma minúscula caixa. Nessa caixa, homens não podem chorar, não têm sentimentos, não precisam ir ao médico, não podem ser vencidos, e ser sensível é quase uma ofensa. Homens só podem se enquadrar no papel indestrutível de ser macho. O seu papel é ter sempre força braçal, raciocínio lógico e infalível, e saúde em abundância. Chorar é um crime inafiançável, porque desde crianças ouvem uma lenda de que “homem que é homem não chora”. Para ter sentimentos, só se enquadram em duas hipóteses nas conversas dos parceiros de futebol: ou é “dominado”, ou traído pela mulher – porque homem deve ser eminente, sempre.

E pra quê ir ao médico? “Isso aí é frescura”, “toma uma dose que resolve”. E por muitos anos, nos índices do mundo todo, o homem é o que mais vem a óbito por não tratar de patologias a tempo de curá-las, por descobrir tarde demais. Assim como, pelas mais diversas razões, o homem esconde por muito mais tempo a depressão, sendo mais propício a tentar o suicídio. De acordo com os dados de análise da Tábua completa de mortalidade para o Brasil de 2018, publicado pelo IBGE, a probabilidade do homem alcançar os 60 anos no ano de 1940 era de 11,6%, enquanto que para a mulher atingir a mesma idade as chances eram de 14,5%. Já em 2017, 20,5% para homens e 24,1% de chances para mulheres alcançarem a melhor idade. Quase oitenta anos depois, embora o índice de mortalidade tenha caído para ambos, a diferença entre os sexos continua muito semelhante.

Até quando os homens precisarão carregar essa pesada armadura e essa incômoda máscara? Vamos lá sociedade, não é tão difícil assim perceber que não há outra saída senão a igualdade. Homens e mulheres, antes de serem indivíduos socialmente encaixilhados, são biologicamente humanos. Todos nós temos necessidades inerentes as nossas opções de escolher tê-las. Humanos sentem dor, medo, cansaço, raiva, mas também sentem desejo, carência, afeto, amor. Homens não são uma classe diferenciada de seres humanos. Não existem super heróis por aqui (e olhem que o homem-aranha é louco pela Mary Jane)… Enquanto o “sexo-frágil” ganha os holofotes, o grito silencioso dos homens continua a vagar em torno do seu particular universo, mas lá, buracos negros não engolem dores, estas permanecem.

Muito se fala nas conquistas da mulher ao longo de todos os anos de estruturação e tentativas de desmonte do patriarcado, do dia 8 de março, do dia das mães, das campanhas de Agosto Lilás e Outubro Rosa, e de todos os espaços que a mulher conquistou. E como boa feminista que sou, tenho que abrir aspas aqui para duas coisas, a primeira, é que todas essas conquistas são de fundamental importância para nós mulheres, embora ainda tenhamos muitos caminhos a serem desbravados; e a segunda, é que esse mesmo feminismo importante para nós é importante para vocês, rapazes. E antes que me interpretem mal, respirem, que a explicação já está logo a diante. Lembram da igualdade que eu citei no parágrafo anterior? Quando nós, mulheres, lutamos por equidade, levantamos a bandeira também por vocês. Da mesma forma que queremos espaços, esperamos que vocês também ocupem alguns espaços que a “sociedade” julga não precisarem ocupar.

Diferente do público feminino que é cercado por campanhas de cuidado, saúde, valorização e inúmeras jogadas de marketing capitalista para estar sempre impecável, para o público masculino restam propagandas de cervejas, carros, preservativos e futebol, algumas poucas vitrines dedicadas ao dia dos pais, e finalmente, o Novembro Azul. A essa altura já se pode imaginar que não foi coincidência que escolhi este mês em questão para lembrá-los do quanto são importantes. A campanha vem para reforçar a importância da prevenção e do diagnóstico precoce do câncer de próstata, que segundo Fundação do Câncer, este é o segundo tipo de câncer mais comum entre os homens brasileiros e as maiores vítimas são homens a partir dos 50 anos.

Bem, se o simples fato de precisar ir ao médico já é uma muralha para os homens, e fazer terapia com um psicólogo é um passo tão difícil quanto escalar o Monte Everest, já podemos imaginar que a campanha do Novembro Azul é essencial. Porém, não suficiente. Todos nós somos responsáveis pelos obstáculos sociais que criamos, e principalmente, que continuamos a alimentar. A misoginia precisa ser combatida, assim como a homofobia, o racismo, e quaisquer outros tipos de intolerância. Não deixando fora destes, o machismo, que diferente do feminismo (que é um movimento social), é um comportamento fundamentado na compreensão de que os homens são superiores às mulheres. E com muita tristeza eu lhes digo que vocês vêm sendo superiores a nós nos mais diversos índices de mortalidade.

Segundo a estimativa da Incidência de Câncer no Brasil para o biênio 2018-2019, todos os tipos de câncer, com exceção do câncer de mama, útero, ovários e tireóides, têm a probabilidade de acometer muito mais homens que mulheres. Além disso, de acordo com o CVV, em média, uma pessoa comete suicídio por hora no Brasil. Também a cada hora, três pessoas tentam, sem sucesso, cometer suicídio. Dentre estes, as mulheres têm a taxa oficial de morte por suicídio de 1,9 para cada cem mil habitantes, e os homens, o índice é de 7,1. E a diferença é gritante. Além do mais, segundo o Ministério da Saúde “Acidentes de trânsito são a segunda maior causa de mortes externas no país. Em 82% dos caso, as vítimas fatais são do sexo masculino”. Mesmo as mulheres sendo taxadas de dirigir mal. Bem, eu poderia continuar uma listagem de outros dados, mas a ideia aqui é apenas uma: chamar a atenção de vocês, homens, para o autocuidado.

A carreira, a família, as ocupações, tudo isso é importante, claro. Mas se a saúde for por água abaixo, todo o resto escoará junto. O trabalho pode esperar, as obrigações rotineiras podem esperar, tenham certeza que não haverá nada de mais importante que estar bem, inclusive para conseguir realizar essas atribuições com melhor eficiência. E a família, bem, estes irão agradecer por poder contar com sua presença por alguns anos a mais, com longevidade e saúde. Com as palavras de Arthur Schopenhauer “O maior erro que um homem pode cometer é sacrificar a sua saúde a qualquer outra vantagem”. Afinal, quais vantagens temos carregando os pesos do descuido? Desarmem-se meus queridos, não há motivos para tanto silêncio, pois seus gritos ecoam somente no próprio interior de cada um, mas haverão de sair por algum lugar um dia. E talvez, seja tarde demais para tentar gritar. Cuidem-se!

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