O Centro Regional das Nações Unidas para a Paz, o Desarme e o Desenvolvimento na América Latina e Caribe (Unlirec) apresentou nesta quarta-feira (30) um monitoramento dos casos divulgados pela imprensa dos casos de presença e o uso de armas de fogo em escolas nos países da América Latina e Caribe. No Brasil, a apresentação do estudo foi feita em um evento junto com o Instituto Sou da Paz.
No total, foram registrados 122 incidentes com armas em escolas entre junho de 2010 e julho de 2019. Argentina (30), México (28) e Brasil (13) aparecem como os países com o maior número de casos, concentrando 60% do total de incidentes reportados na imprensa neste período. O órgão fez um monitoramento similar entre 2000 e 2010 e registrou cerca de 50 ocorrências que foram reportadas nos meios de comunicação
“As escolas não estão isentas da presença e do problema da proliferação de armas e a violência armada que está afetando os diferentes países da região. Nos últimos anos, tem sido mais recorrentes notícias nos meios de comunicação sobre incidentes que envolvem armas e estudantes e a presença das armas nas escolas”, disse Walter Murcia, assessor de projetos da Unlirec.
Entre os tipos de incidentes, estão o encontro de armas de fogo dentro do ambiente escolar sem posse atribuída a alguém (7); porte de arma por estudante ou encontrada em seus pertences (64); e uso de armas de fogo com disparo ou uso para ameaçar, intimidar ou roubar (31). Em 66% dos incidentes, a escola era pública; em 15% escolas privadas; e 19% sem informação na publicação.
A presença de armas de fogo em escolas é um fenômeno multicausal que tem entre as principais motivações casos relacionados a brigas e ameaças dentro das escolas (45%), aceitação cultural e social das armas de fogo e exibicionismo (36%), bullying (10%) e suicídio (3%).
Feridos e mortos
O Brasil é o país com o maior número de feridos por arma de fogo dentro das escolas, com 37 pessoas feridas. Em seguida, vem o México, com 10 feridos, e a Argentina, com quatro. No total, foram registradas 62 feridos, resultado de 27 dos 41 incidentes com disparos. Ou seja, em 65% do total de incidentes foi registrado ao menos um ferido.
A quantidade de mortos dentro das escolas também foi maior no Brasil, com 20 óbitos, seguido pelo México (7) e Peru, Argentina e Costa Rica – cada um com uma morte. No total, foram 36 óbitos, sendo 30 estudantes. Os demais eram ex-alunos, docentes e auxiliares.
Foram identificados ao menos 4 tiroteios entre o total de incidentes analisados, sendo três deles no Brasil: no município de Suzano (SP), em março de 2019; em Goiânia, em outubro de 2017; e em Realengo (RJ), em abril de 2011. O quarto tiroteio foi em Monterrey, no México.
Perfil
Sobre o perfil dos portadores de arma de fogo em escolas, foram contabilizados 105 estudantes, dos quais 92% eram do sexo masculino e 8% do sexo feminino. Dos estudantes homens, 60% dos envolvidos nos incidentes com armas de fogo tinham entre 13 e 18 anos. “Outro achado que é parte dessa pesquisa é que existe uma grande quantidade de estudantes do sexo masculino envolvidos. Vemos a presença do fator de masculinidade com as armas de fogo”, disse Murcia. Ele acrescentou que a arma de fogo pode ser usada como um símbolo de poder e de autoridade.
Segundo a Unlirec, a presença e uso de armas em escolas se explica também pelo seu fácil acesso e proliferação nos países da região. Em, ao menos 25 casos, a procedência das armas tinha relação direta com as casas dos estudantes. “Isso é muito importante porque o estudante agora está passando mais tempo em casa do que na escola. Devemos levar em conta as medidas de armazenamento e fazer com que isso faça parte da legislação do controle de arma”, avaliou Murcia.
A Gerente de Projetos do Instituto Sou da Paz, Natália Pollachi, cita que, no caso específico do Brasil, em relação à proteção do acesso a armas de fogo por crianças e adolescentes, há a previsão do crime de omissão de cautela. “O proprietário é responsável por manter essa arma longe do alcance de crianças e adolescentes, mas [o mecanismo] é bastante frágil. Com as regras atuais, basta o proprietário declarar ter um local seguro para essa guarda, não existe uma especificação mais clara do que seria esse local, uma fiscalização física, nada disso”, disse Natália.
Para o combate e prevenção dos incidentes com armas de fogo em escolas, Natália elencou a necessidade de cuidado com difusão de terror e cuidado com propostas de militarização; o desafio policial na deep web e também com aplicativos mensagem e no combate a tráfico de armas; identificar alunos em sofrimento psíquico (agressividade, automutilação, depressão, entre outros) e a identificação de onde a rede falhou em casos anteriores.
Por Camila Boehm / Agência Brasil