Na semana passada, o cineasta argentino Carlos Pronzato, acompanhado do empresário e ativista social Alexandre Sampaio, iniciou uma série de entrevistas na imprensa nacional para a divulgação do documentário “A Braskem passou por aqui: a catástrofe de Maceió”, cujo pré-lançamento aconteceu em São Paulo e a estreia está marcada para o dia 5 de agosto na capital alagoana.
O longa-metragem retrata o maior crime socioambiental em curso no mundo, que condenou cinco bairros na capital alagoana pelo afundamento do solo, tendo atingido cerca de 67 mil moradores, 4.500 negócios e 30 mil empregos.
Com o intuito de dar visibilidade à narrativa das pessoas vitimadas acerca do caso, Pronzato, conhecido por obras sobre o crime da Vale em Brumadinho e o apagão no Amapá, juntou-se a Sampaio, que lidera movimentos de vítimas em Maceió, para romper o cerco político e econômico imposto pela mineradora no estado de Alagoas.
Entrevista ao Brasil 247
Em entrevista ao jornalista veterano Joaquim de Carvalho, no programa Boa Noite 247, a dupla tratou da importância histórica do documentário e deu detalhes sobre o crime que assola dezenas de milhares de pessoas em Maceió. Segundo o diretor do longa, a escolha dos entrevistados funcionou para revelar pontos de vista que acabam sendo adormecidos pela imprensa local perante a opinião pública. “Entrevistamos moradores, empreendedores, engenheiros, geólogos e até ex-servidores do estado”, adiantou Pronzato. Sob esse aspecto, mora o caráter inédito do filme, como afirma Alexandre Sampaio. “É a primeira vez que a gente consegue, graças ao trabalho do Carlos, contar a narrativa das vítimas e denunciar esse crime tão bárbaro”, afirmou o empresário.
No bate-papo ao vivo, transmitido pela TV 247 no YouTube, Sampaio, que é presidente da Associação dos Empreendedores no Pinheiro e Região Afetada e membro participante do Movimento Unificado das Vítimas da Braskem (MUVB), traçou um breve panorama do crime. “Após quatro décadas de exploração minerária indevida em 35 minas, a cerca de 1.200 metros de profundidade, tivemos um tremor de 2.5 na escala Richter, no dia 3 de março de 2018”, relatou. O empresário explicou que os abalos são resultado de uma série de desabamentos dessas minas, já que elas foram escavadas muito próximas umas das outras e com o dobro do tamanho permitido. “Os desabamentos de minas ocorrem há mais de 10 anos, já tendo formado crateras subterrâneas do tamanho do Complexo Esportivo do Maracanã. Porém, as autoridades sempre silenciaram sobre isso.”
A respeito da estranha conivência dos poderes públicos, Pronzato revelou algumas das imposições desse silenciamento, como, segundo ele, ficou exemplificado pelo depoimento de José Geraldo Marques, um dos entrevistados no longa-metragem. “Durante a implementação da exploração de sal-gema em Maceió, Geraldo era uma espécie de secretário do meio ambiente em Alagoas”, contou. “Ele foi uma das autoridades que se opôs à instalação da mineradora e falou que, por isso, além de uma forte campanha de difamação a seu trabalho na imprensa, sofreu ameaça com uma arma de fogo pelo secretário de planejamento.”
Dentre os poderes que compõem o cenário de descaso, Sampaio destaca os ministérios públicos, as defensorias públicas, o Governo de Alagoas, de Renan Calheiros Filho (MDB), e a Prefeitura de Maceió, comandada por João Henrique Caldas (MDB). “Foi feito um acordo entre a Braskem, os MPs e as DPs sem a participação ou a representação direta das vítimas. Respaldada nesse acordo — por natureza, injusto —, a mineradora faz absolutamente o que quer”, denunciou. Ainda de acordo com o ativista, o governador do estado e o prefeito da cidade não apoiaram as vítimas no pedido de revisão do acordo. “Eu espero que esses entes cumpram seu papel de funcionários públicos no intuito de defender a população e não uma multinacional bilionária.”
Entrevista à Globo News
No programa “Estúdio i”, do canal Globo News, o jornalista André Trigueiro foi convidado para falar sobre o pré-lançamento do documentário. Em conversa com Maria Beltrão, Trigueiro alertou para a situação de desamparo das vítimas, que sofrem com danos patrimoniais, financeiros e emocionais profundos, como o filme se propõe a mostrar. Segundo ele, “na maioria dos casos, as pessoas não foram indenizadas”. “O valor da indenização não corresponde ao valor do imóvel que essas famílias gostariam de ter por equivalência”, afirmou.
Trigueiro também relembrou que os crimes socioambientais já se configuram como uma prática consolidada no país. “A gente encontra, no Brasil, episódios correlatos, como Brumadinho em relação à Vale, onde tivemos um passivo social que também não foi prontamente coberto”, alertou. Mais especificamente sobre o Caso Braskem em Maceió, o jornalista demonstrou espanto. “É incrível como, no nosso país, por razões que eu não vou entrar no mérito, a Justiça não é rápida e é, por vezes, falha na arbitragem das indenizações devidas para que as pessoas prejudicadas em eventos do gênero não fiquem na mão.”
Carlos Pronzato em entrevista à Globo News / FOTO: Divulgação
Após a exibição do trailer do longa-metragem e a fala do diretor do filme, Trigueiro encerrou a pauta com um chamado às instituições nacionais, que, atualmente, mostram-se totalmente submissas aos desmandos do poder econômico responsável por controlar a mineradora Braskem. “O que está acontecendo em Maceió deve nos alertar sobre a agilidade que a Justiça brasileira precisa ter, e também que os órgãos ambientais, os órgãos de governo, como o Ministério Público, não podem se omitir, têm que comparecer!”
Pré-lançamento e coletiva de imprensa
Na noite de quinta-feira (22), profissionais da mídia nacional e acadêmicos da USP foram recebidos por Carlos Pronzato e Alexandre Sampaio no espaço Corp Tower, entre a Av. Paulista e a Alameda Santos, para assistir, em primeira mão, o documentário “A Braskem passou por aqui: a catástrofe de Maceió”. Em sala restrita a 30 lugares, o diretor do filme e o empresário alagoano responderam às perguntas dos presentes antes da exibição do longa.
“A coisa mais importante do documentário, na minha visão, é dar voz às vítimas, pois, até então, prevalece, na mídia, a narrativa da Braskem”, declarou Carlos Pronzato. Sampaio aproveitou para reforçar a denúncia acerca do descaso das instituições brasileiras frente ao crime. “Com o filme, mostrando a extensão do dano causado aos bairros, às pessoas e às empresas, pode-se fazer oposição à conduta dos órgãos públicos, que se apresentam como porta-vozes da mineradora.”
“A pré-estreia do documentário em São Paulo está sendo fundamental para nacionalizar um tema que, apesar de ser o maior desastre socioambiental em curso no mundo, estava restrito a Maceió”, pontuou Alexandre Sampaio. Para ele, a semana repleta de compromissos com a imprensa em São Paulo deve surtir efeitos positivos na luta por justiça em Alagoas. “O filme já cumpriu o papel importante de publicizar em nível nacional um tema que não pode estar restrito ao poder econômico imposto pela Braskem na mídia local.”
Por Assessoria