Centros de Atenção Psicossocial diminuem internações em hospitais psiquiátricos

03 nov 2014 - 07:00


Instituições aproximam portador de transtorno mental da família e trabalham a ressocialização.

Foto: Carla Cleto

Foto: Carla Cleto

Os muros altos e o isolamento dos hospitais psiquiátricos estão sendo substituídos, a médio e longo prazo, pelos ambientes menos hostis e mais abertos dos 55 Centros de Atenção Psicossocial (Caps) de Alagoas. Estas instituições também atendem aos portadores de transtornos mentais de casos mais severos e persistentes e proporcionam a eles e às famílias a oportunidade de tratamento e o retorno aos lares no mesmo dia, evitando as internações.

A Secretaria de Estado da Saúde (Sesau), por meio da Gerência de Núcleo de Saúde Mental (Gensam), dá suporte a estas instituições através de capacitações e mediação de eventuais problemas enfrentados por elas. Diferentemente dos hospitais psiquiátricos, nestes centros eles ficam menos ociosos, podem ter a companhia dos pais ou responsáveis e o tratamento acaba tendo uma linha mais humanística.

Outro diferencial dos Caps está nos muros baixos e quem passa na rua pode visualizar o que os pacientes estão fazendo e como estão sendo tratados naquele ambiente. Pelo menos é esta a realidade do Caps I Emília Barbosa e do ambulatório de saúde mental, ambos localizados em Junqueiro, que têm cadastrados em média dois mil portadores de transtornos mentais. O Caps funciona de segunda a sexta-feira das 8h às 16h.

As duas instituições atendem em média 192 pacientes por mês, sendo que o ambulatório presta assistência aos casos mais leves de transtorno, a exemplo de ansiedades e outras neuroses. No Caps de Junqueiro, visivelmente aconchegante, a palavra de ordem é ocupação, ou seja, os pacientes passam o dia todo envolvidos em atividades terapêuticas e oficinas de geração de renda.

De acordo com a gerente do Caps, Micheline do Carmo, os portadores de transtornos mentais têm os dias da semana programados seguindo o Projeto Terapêutico Singular (PTS), que significa a proposta de tratamento ideal para cada caso. As atividades incluem o grupo de geração de renda, a exemplo da hortoterapia, oficinas de costura, arte culinária, dentre outras que trabalham a autonomia, profissionalização e reinserção social dos pacientes.

Casos frequentes

Os usuários que buscam estas instituições geralmente têm esquizofrenia, depressão, pânico, transtorno bipolar ou são usuários de álcool, craque e outras drogas. O Caps 1 de Junqueiro tem uma equipe formada por psiquiatra, assistente social, psicólogo, enfermeiro, terapeuta ocupacional, farmacêutico, psicopedagogo, oficineiros, auxiliar de enfermagem e monitores de pátio.

O objetivo dos Caps é atender o paciente em crise e diminuir o máximo o número de internações em hospitais psiquiátricos. Micheline acrescenta que os problemas de transtornos mentais de Junqueiro estão mais ligados à consanguinidade, ou seja, de ordem genética, a exemplo dos casamentos entre primos e outros.

A chegada de uma mulher de 32 anos em crise chamou a atenção dos funcionários e demais usuários do Caps 1. Com semblante visivelmente sofrido, os pais José Barbosa e Maria Aparecida contaram que a jovem sofre de esquizofrenia desde os 21 anos e tem dois irmãos com o mesmo problema. “Ela passou um ano internada em um hospital psiquiátrico e teve mais de 10 internações em outros. Era linda, tinha cabelos longos e os dentes perfeitos e hoje está deste jeito”, disse a mãe, com lágrimas nos olhos, enquanto observava a filha sendo atendida pela psicóloga e gerente da instituição, Micheline.

De mãe para filho – Drama parecido sofre um jovem de aproximadamente 30 anos que durante anos foi mantido pela família em cárcere privado porque não sabia lidar com o problema. A gerente disse que a mãe também e um dos irmãos têm problemas mentais. Como não aprendeu a falar, o rapaz andava de um lado para o outro balbuciando palavras, tentando conversar com os colegas que não conseguiam entender o que ele dizia.

Micheline disse que ele ficava preso o dia inteiro e a alimentação era colocada ao lado dele. De acordo com ela, o rapaz está aprendendo a falar e passando por todo um processo de ressocialização. Outros pacientes, já mais adiantados no tratamento participam de oficinas de costura, a exemplo de quatro senhoras que, orgulhosas, exibiam as peças que estão confeccionando, a exemplo de bolsas e artigos para festas de aniversário e casamento.

A gerente diz que os produtos confeccionados pelos usuários são comercializados e a renda revertida para as costureiras. A hortoterapia é outra oficina que atrai o interesse dos usuários daquele Caps, a exemplo de Selma Maria da Silva, que encontra naquela função a possibilidade de interagir com pessoas com problemas semelhantes. “Gosto do que faço e de colocar a mão na terra. O dia passa rápido quando a gente fica ocupada”, disse, enquanto arrancava um pé de alface.

O alcoolismo também leva pessoas ao Caps, como é o caso de Sérgio de Souza. Meio envergonhado, ele conta que o álcool quase acabou com seu casamento e que começou a beber ainda adolescente. “Meu pai bebia e não sei se me influenciou, mas hoje me seguro para não tomar o primeiro gole e passo meses sem beber”, diz, com olhar distante.

Atendimento aos usuários

Os portadores de transtornos mental, emocionais e dependentes químicos de álcool e drogas de Alagoas têm tido maior oferta de cuidados extra-hospitalares com o crescimento dos Centros de Atenção Psicossocial (Caps), que hoje totalizam 55, com dez em processo de implantação, beneficiando ao todo mais da metade dos municípios alagoanos.

Por meio deles, os usuários em crise ou com transtornos comportamentais severos podem ser tratados de forma ambulatorial, no município ou região, evitando as internações em hospitais psiquiátricos. A informação é da técnica da Gerência do Núcleo de Saúde Mental, da Secretaria de Estado da Saúde (Sesau) , Laeuza Farias.

De acordo com ela, o Estado tem investido em capacitação dos profissionais, com o objetivo de qualificar os serviços prestados pelos Centros de Atenção Psicossocial, cuja execução é de responsabilidade dos municípios. “Temos uma rede de Caps ampla e estamos sempre investindo na qualidade deles, já que a dependência química fez aumentar a demanda”, reforçou.

Implantação de novos Caps

Em processo de implantação de Caps estão Craíbas, Passo de Camaragibe, Porto de Pedra, Piaçabuçu, Penedo, Inhapi, entre outros. O gerente do Núcleo de Saúde Mental da Sesau, Berto Gonçalo, destacou que Maceió tem potencial para implantar uma rede de saúde mental, em cada distrito sanitário, composta por Caps I (Infanto-juvenil), Caps II (transtornos), Caps III 24 Horas, Caps AD III (Álcool e Drogas), Caps AD 12 Horas, residências terapêuticas, leitos de saúde mental em hospital geral e unidade de acolhimento.

“Foi pactuado com as três esferas de governo que a nova rede de Atenção Psicossocial 2014/2016 será ampliada e os serviços já foram pactuados com os gestores locais. O teor da rede se encontra na Coordenação Nacional de Saúde do Ministério de Saúde para ser avaliado e aprovado”, afirmou Berto Gonçalo.

Entre as conquistas da área, segundo ele, constam ainda o projeto Copa Caps e Infocaps, projeto de inclusão digital, que beneficiou, em dois anos de implantado, 420 portadores de transtornos mentais.

Nos casos de internações, quando os Caps não resolvem, os usuários do Sistema Único de Saúde (SUS) podem dispor de tratamento nos hospitais psiquiátricos Miguel Couto, Ulysses Pernambucano, José Lopes, em Maceió e Instituto Teodora Albuquerque, em Arapiraca.

Por Maryland Wanderley / Agência Alagoas

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