Um grupo de trabalhadores interessados em participar da construção do Canal do Sertão decidiu acionar o Ministério Público Estadual (MPE) para denunciar o uso eleitoreiro da obra. Segundo eles, os currículos encaminhados à Construtora Odebrech, executora das obras do Setor IV do projeto, estão sendo repassados a prefeitos da região que escolhem para trabalhar somente aqueles que sejam seus simpatizantes políticos.
A denúncia envolve diretamente os prefeitos de Senador Rui Palmeira, João Carlos Rodrigues, e de São José da Tapera, Jarbas Pereira Ricardo, ambos do PSDB. Segundo os trabalhadores, eles estariam agindo de forma a beneficiar a candidatura tucana ao governo do Estado, sendo que hoje o nome mais ligado ao Canal do Sertão, na gestão de Teotonio Vilela, é do ex-secretário de Infraestrutura, Marco Fireman, presidente do PSDB em Maceió.
Fireman, aliás, deixou a titularidade da Secretaria de Estado de Infraestrutura (Seinfra) em janeiro último, justamente por estar interessado na disputa de outubro. Mas o fato de ter saído oficialmente do governo não o tirou do foco do noticiário oficial. Ele continua sendo citado com frequência em solenidades e no material de divulgação da Agência Alagoas (agenciaalagoas.al.gov.br), o portal de comunicação do governo do Estado encarregado de centralizar e distribuir releases para a imprensa.
A DENÚNCIA
O grupo que denuncia o uso eleitoreiro do Canal do Sertão é composto por 15 trabalhadores, cujos nomes estão sendo preservados até que a denúncia seja oficializada ao promotor de Justiça Luiz Tenório de Almeida. O representante do MPE, aliás, foi contatado, mas afirmou que somente vai se posicionar sobre o caso após ser cientificado dos fatos.
Segundo eles, os currículos entregues no escritório da Odebrecht em Senador Rui Palmeira são levados por um funcionário, identificado apenas por “Mileno”, para serem analisados pelos prefeitos João Carlos Rodrigues e Jarbas Pereira Ricardo aos quais cabe a decisão de dizer quem será contratado.
Irmão de um ex-candidato a vereador nas eleições de 2012, “Mileno” é ligado politicamente ao prefeito de Senador Rui Palmeira, mais conhecido como “Joãozinho”. Ainda de acordo com os denunciantes, parentes de funcionários das prefeituras também estariam sendo beneficiados pelas contratações dirigidas.
O QUE DIZEM AS PREFEITURAS
A versão da Prefeitura de Senador Rui Palmeira foi dada pela secretária de Governo Jeane Moura. De acordo com ela, houve um pedido por parte de ambos os prefeitos para que na contratação de pessoal fosse dada prioridade aos moradores da região. Assinalando que a “Odebrecht é uma empresa muito séria e tem sua própria política”, ela afirmou que um dos responsáveis pela obra, a quem identificou apenas pelo nome de Rafael, pediu “para o pessoal da cidade levar os currículos”, mas garantiu que a empresa está contratando pessoas dos dois lados políticos (governo e oposição). “Só está na Odebrecht quem tem o melhor currículo”, frisou, assinalando que não existe nenhum convênio da prefeitura com a construtora, apenas uma parceria pela qual a empresa se comprometeu a dar prioridade para trabalhadores da região.
Ninguém quis falar sobre as denúncias pela Prefeitura de São José da Tapera, argumentando que somente o prefeito Jarbas Ricardo poderia se pronunciar, sendo que o mesmo está em Miami (EUA).
MULTINACIONAL NEGA
A Odebrecht Infraestrutura Brasil, braço do conglomerado brasileiro que atua em vários países nas áreas de engenharia, construção, produtos petroquímicos e químicos, é a, responsável pela construção do trecho IV do Canal do Sertão Alagoano e rebateu as denúncias. Em nota, a empresa afirmou que “a qualificação e o perfil profissional do candidato à vaga são os critérios analisados pela equipe de Recursos Humanos da empresa, responsável pelo recrutamento. A Odebrecht prioriza a contratação de trabalhadores que moram nos municípios de São José da Tapera, Senador Rui Palmeira, Olho d’Água das Flores, Carneiros, Piranhas, Santana do Ipanema e demais localidades do entorno para atuarem na obra, conforme cronograma de necessidade dos trabalhos”.
Ainda segundo a nota, “interessados em participar das possíveis seleções, às vagas oferecidas pela obra, podem entregar currículos para análise da área de Recursos Humanos e cadastramento no banco de dados, no canteiro administrativo da empresa, em dias úteis”.
O EX-SECRETÁRIO
O presidente do PSDB em Maceió, Marco Fireman, não é o único ex-secretário a buscar a indicação tucana para suceder o governador Teotonio Vilela, mas tem sido entre os postulantes uma presença cada vez mais frequente nos eventos oficiais do Executivo, tendo sido, inclusive, um dos agraciados com a Medalha do Mérito Institucional da Polícia Militar “Zumbi dos Palmares”, concedida no dia 21 de março último.
Depois de sete anos à frente da Seinfra, pasta responsável pelo Canal do Sertão, o ex-secretário também não perde oportunidade para atrelar seu nome à obra, como atesta o release do PSDB Maceió distribuído à imprensa no dia 29 de março com o título “Com um ano de operação, Canal do Sertão já leva água para 200 mil pessoas”.
O EXTRA tentou falar com Fireman, através de sua assessoria, sobre as denúncias de uso eleitoreiro da obra, mas até o fechamento desta edição não houve retorno aos contatos por telefone e por email.
A OBRA
As obras do Canal do Sertão começaram em 1993, na gestão de Geraldo Bulhões (1991-1995), mas foram interrompidas por falta de recursos e abandonadas pelo sucessor, Divaldo Suruagy (1995-1997), sob alegação de que não havia estudo técnico que comprovasse a viabilidade do projeto.
Retomadas somente após serem incluídas no PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), o canal, que após ser concluído vai levar água do Rio São Francisco a 42 municípios das regiões do Semi-Árido e do Sertão e terá 250 km de extensão, teve seus dois primeiros trechos inaugurados em março do ano passado, num total de 65 km.
Obra constante do PAC2, sob a responsabilidade do Ministério da Integração e executada pelo Estado através da Seinfra, a construção do Canal do Sertão, na qual já foram investidos R$1.024.480.000,00, está sendo feita por trechos, sendo que os I, II e V estão a cargo da Construtora Queiroz Galvão; o trecho III vem sendo construído pela OAS; e, o IV pela Odebrecht.
No trecho IV, que compreende os municípios de São José da Tapera e Senador Rui palmeira, está sendo implantado um canal adutor com 30,47 quilômetros de extensão. De acordo com a empresa, no pico de obras estarão em atividades cerca de 2 mil trabalhadores.
Por Vera Alves e Robson Cordeiro / Rota do Sertão