Louis-Joseph Lebret (1897-1966), ou simplesmente, padre Lebret, como era conhecido esse dominicano, foi daquelas poucas pessoas que “desembarcaram” nesse mundo com uma missão ímpar: promover a aproximação entre o pensamento cristão vinculado à ação econômica voltada exclusivamente para a promoção de uma sociedade mais fraterna e menos injusta.
De forma apurada, padre Lebret teve uma visão humanista da economia, uma visão diferenciada na maneira de se pensar a economia pelas lentes do social.
Nascido a 26 de junho de 1897, em Minihic-sur-Rance, na Bretanha, Lebret conseguiu ao longo do tempo em que viveu – 69 anos – criar e consolidar um pensamento social cristão ressaltando a importância da construção de uma civilização mais solidária. Nunca se esqueceu de que as bases principais dessa premissa repousam no respeito em primeiro lugar ao ser humano, vendo-o como um ser capaz de agir em prol do estabelecimento de um mundo mais justo, e não somente “encarnado” na pele de consumidor, tão ao gosto capitalista que apregoa um tipo de economia que apenas valoriza a posse material, e não o ser humano.
Desse modo, a vida de Lebret, enquanto teólogo de ação e pensador social, esteve diretamente entrelaçada em dois movimentos criados e estruturados para dinamizar uma cultura econômica e social mais fraternal. Cultura essa que, infelizmente, nos dias de hoje, tem regredido na escala de valores, afastando-se assim daquilo que se convenciona chamar de prática do bom-senso. Os movimentos em questão são: i) a revista “Économie et Humanisme”; e ii) o “Movimento dos Economistas Cristãos”.
Ambos os movimentos, a partir do início dos anos 1940, fizeram com que Lebret concebesse uma nova visão da economia em função do ser humano, orientando-a para a satisfação das necessidades e das aspirações de cada um comprometidos com um sistema econômico capaz de priorizar as pessoas, e não o mercado e suas mercadorias. Com esses “movimentos”, pautados no método “ver, julgar e agir”, Lebret viabilizou projetos de desenvolvimento e valorização das relações humanas sob as bases da tradição cristã.
É interessante pontuar, a esse respeito, que esses dois “movimentos” marcaram sistematicamente o posicionamento religioso e econômico de uma pessoa que devotou parte considerável de sua vida para desmitificar o deus-mercado e valorizar o ser humano desprovido de recursos. Como bem aponta Manuela Silva num brilhante texto em homenagem a Lebret: (…) “Esses dois projetos estão interligados por um denominador comum – o conceito de economia humana, uma economia posta ao serviço das pessoas e dos povos, de todas as pessoas e de todos os povos. É um conceito de inspiração cristã que tem atravessado os documentos do magistério da Igreja e tem a sua consagração na Carta encíclica Populorum Progessio”.
Padre Lebret, indiscutivelmente, sempre foi um homem de ação. Foi ainda um pensador incomodado com as injustiças socioeconômicas que sempre fizeram com que a exclusão de muitos fosse algo inaceitável num mundo que caminhava a passos largos para a conquista tecnológica, mas que era, ao mesmo tempo, por forças mercantis, incapaz de acabar com o problema da fome e da miséria humanas.
Em 1958, chamado a contribuir para o esclarecimento das causas do subdesenvolvimento em algumas partes do mundo, Lebret, junto a um grupo de intelectuais, fundou o IRFED (Institut de Recherche et Formation em vue du Développement), transformado depois em Centre Développment et Civilisations – Lebret-IRFED, com a missão de oferecer assistência técnica no desenvolvimento dos países considerados atrasados, formando, para tanto, quadros cristãos empenhados na ação humana.
Assim, em rápidas palavras, os conceitos, as ações, o modo de ser, agir e pensar e, acima de tudo, o exemplo de vida deixado por Padre Lebret deveriam, para o bem de uma disciplina que pretende também ser vista como uma espécie de “auxiliadora” para a busca da promoção social, ser ensinados em todos os cursos superiores de ciências econômicas. De modo geral, não é exagerado afirmar que os futuros economistas necessitam “respirar” os ideais de Padre Lebret. Acontecendo isso, a economia humana saberá agradecer essa prática.
Marcus Eduardo de Oliveira é economista e professor de economia da FAC-FITO e do UNIFIEO, em São Paulo. Mestre pela Universidade de São Paulo (USP) e especialista em Política Internacional pela FESP-SP.
Dificilmente iremos ingressar num novo tempo de prosperidade saudável e economicamente desejável com possibilidades de bem-estar estendida a todos se não mudarmos o quanto antes o foco e o direcionamento da atividade econômica baseando-a em uma racionalidade ambiental. Quem diz isso é o economista Marcus Eduardo de Oliveira.
Crítico severo em relação ao comportamento da macroeconomia tradicional que enaltece o mercado e as mercadorias, fazendo vistas grossas à questão ambiental, Marcus de Oliveira diz que “o modelo econômico praticado em larga escala, pelo menos nos últimos 110 anos, já se esgotou e chegou o momento da reversão, até mesmo porque, até hoje, esse modelo gerou uma distribuição muito desigual dos ganhos”.
Os números da desigualdade socioeconômica parecem mesmo comprovar o argumento do economista. Em relação a isso, Oliveira ponderou que “atualmente, apenas 20% da população mais rica do mundo utilizam ¾ dos recursos naturais, numa situação em quase metade da população (3 bilhões) ou está diretamente na pobreza ou habita nos limites dessa. Ora, isso é fruto de um modelo que priorizou o crescimento de forma exagerada, beneficiando poucos, sem o devido controle e cuidado para com a questão ambiental, em detrimento daqueles que mais necessitam. Resultado? Hoje temos 1 bilhão de estômagos vazios em um ambiente caótico, fruto da degradação praticada pela voracidade desse crescimento econômico. Por isso, é urgentemente necessário se pensar numa nova etapa da economia”.
Para Marcus de Oliveira “uma nova economia centrada em uma base de racionalidade ambiental deve dar conta também, além do óbvio que é salvaguardar o espaço natural, de ser inclusiva, criando mecanismos para acabar com a vergonha de ainda termos esses um bilhão de estômagos vazios vagando pelo mundo”.
Essa nova economia centrada na racionalidade ambiental, com baixo carbono, deve passar pela geração e expansão dos chamados empregos verdes (green Jobs), potencializando a mão de obra em tarefas que zelam pela questão ambiental. No caso específico do Brasil, os últimos dados apontam para a existência de 3 milhões de pessoas empregadas em atividades de empregos verdes.
“O caminho de qualquer economia que prioriza e faz de tudo para atender aos ditames do mercado que clama por mais produção e consumo, atingindo picos de crescimento inimagináveis é previamente conhecido: destruição ambiental, desmatamento, poluição, queimadas, escassez ecológica, extinção das espécies, emissão de gases de efeito estufa, entre outros”, ponderou o economista.
Autor de vários artigos sobre a relação da atividade econômica com a natureza, Marcus Eduardo de Oliveira ressaltou a importância da perspectiva ambiental no contexto econômico dizendo que “somos levados a pontuar um fato inexorável: a economia está ´dentro´ de algo muito maior chamado meio ambiente. Não se pode pensar a economia fora disso. Sem sistema ecológico não há economia. Assim, é de fundamental importância a racionalidade ambiental nos entornos da atividade econômica”.
Toda essa questão envolvendo a necessidade de se atingir crescimento econômico versus a capacidade da natureza em oferecer recursos naturais tem se acirrado nos últimos tempos por conta das mais diversificadas fases de desequilíbrio ambiental verificado em quase todas as partes do mundo.
Oliveira, por fim, comentou que “crescimento é a expansão das bases físicas da economia (fazer mais), o que significa aumentar a pressão sobre os recursos naturais, ao passo que desenvolvimento é assegurar melhorias nas condições de vida (viver melhor). O primeiro conceito se prende ao lado quantitativo (mais); já o segundo se refere ao aspecto qualitativo (melhor). Pensar uma nova etapa da vida econômica significa pensar antes na vida ecológica salvando o planeta para o bem de todos nós”, concluiu o economista.
Historicamente, a luta pelo acesso à terra no Brasil sempre deixou corpos de camponeses molhados de sangue espalhados pelo chão. Ao longo dos tempos, esses corpos somente ocuparam as covas largas e profundas do latifúndio, ilustrando assim a poesia de Chico Buarque e João Cabral de Melo Neto (Funeral de um Lavrador / Morte e Vida Severina). Conflitos, trabalho em condições análogas à escravidão e concentração de terras são profundas marcas que sangram a história agrária desse país.
A nossa ainda intacta estrutura agrária, tacanha desde a gestação das cartas de sesmarias (documentos autorizando doações de terras) e das Capitanias Hereditárias (15 amplas faixas de terras entregues a 12 capitães do rei) somente fez, desde então, grassar latifúndios improdutivos (do latim “lato”: extenso, largo, fundo).
Pela força dos grandes proprietários (fazendeiros, madeireiros e empresários) incontáveis braços nunca puderam roçar seu próprio pedaço de solo, pois a reforma agrária sempre foi vista como uma ameaça ao direito de propriedade. Resultado? Muita gente sem terra e muita terra sem gente (são mais de 90 milhões de hectares improdutivos e somam-se mais de 4 milhões de famílias sem terras). Moral da história? Um contingente de miseráveis “escondidos” nos escandalosos bolsões de pobreza (segundo dados da Pnad, base 2009, dos 30,7 milhões de pessoas que abrigavam a zona rural, 8,4 milhões eram classificadas como pobres com renda per capita mensal de 1/2 salário mínimo e, 8,1 milhões de pessoas encontravam-se abaixo da linha de extrema pobreza, com ganhos também per capita de ¼ do salário mínimo). Quais as consequências econômicas e sociais disso? Preferência pelas exportações ao passo que nossa gente mais simples se distancia dos alimentos. Assim, forma-se o paradoxo dos paradoxos: mais de 15 milhões de bocas esfaimadas e estômagos vazios vivendo no quinto maior país em extensão territorial (perdemos apenas para Rússia, Canadá, China e EUA).
Disso resulta que nosso país “opta” por exportar, por exemplo, vitaminas e suco de laranja, adoçando principalmente as bocas dos europeus, quando milhares de crianças daqui nunca tomaram um copo de suco dessa fruta que custa 60 centavos. Mais estarrecedor ainda é dar-se conta de que desde a década de 1980 somos o maior produtor mundial de laranja. Estima-se que há 190 milhões de pés de laranja – um para cada brasileiro. Somos o maior produtor mundial de mamão e o 3° exportador dessa fruta depois do México e Malásia. E não há dúvidas de que incontáveis brasileiros desconhecem o sabor dessa fruta. Até 2020, a exportação brasileira de carnes (bovina, suína e de frangos) suprirá quase 45% do mercado mundial, e cabe perguntar: quantos são os brasileiros que nunca provaram desses alimentos?
Tristemente, assim está sendo escrita a história agrária desse país: de um lado, os camponeses, a agricultura familiar com suas dificuldades, lutando para sobreviver. Do outro lado, a exuberância do agronegócio que se empanturra com os dólares adquiridos das exportações. A tabela a seguir, elaborada a partir do Censo Agropecuário de 2006 (o último realizado), apresenta alguns dados pertinentes a esses dois modelos.
Vejamos o lado que diz respeito à concentração de terras – mais de 350 milhões de hectares estão prontos para o cultivo; entretanto, apenas 72 milhões são utilizados. De acordo com o último censo, os pequenos agricultores tem 24% de todas as terras privatizadas do Brasil, ou seja, de cada 100 hectares de terras, 24 é de camponês. Já os médios e grandes tem 76% de todas as terras; de cada 100 hectares, 76 é do agronegócio. Quinze mil fazendeiros detêm mais de 98 milhões de hectares. Esses priorizam as exportações, pois do que produzem apenas 30% vai para o mercado de consumo doméstico.
O outro lado dessa história responde pelos assassinatos, conflitos e pelas ações violentas como ameaças de pistoleiros profissionais – segundo a Comissão Pastoral da Terra (CPT), em seu 27° Relatório intitulado “Conflitos no Campo – Brasil 2011”, as ações violentas cresceram 24% (de 835, em 2010, para 1035, em 2011), ao passo que, em 2010, 29 trabalhadores rurais perderam a vida e, em 2011, foram 30 corpos espalhados ao chão; em geral, explodidos por balas no peito. Somado a esse triste cenário, a escravidão no campo ainda mostra sua cara em pleno século XXI, expondo a dor e o sofrimento de rostos enrugados precocemente pelo esforço físico. Segundo o referido relatório, o número de ocorrências de trabalho escravo no meio rural aumentou 12,7% entre 2010 e 2011. Em 2011, entre denúncias muito bem documentadas e flagrantes que resultaram em libertação foram identificados 230 casos, contra 204, em 2010. Nesse ano de 2010 foram libertos 2.914 trabalhadores. No ano passado, 2.095. Dos 27 estados da federação, em 19 foi identificado trabalho escravo (em 70% do território nacional) sendo que 39% dessas ocorrências se deram em atividades de corte de cana-de-açúcar, produção de carvão vegetal e desmatamento. Lamentavelmente, estamos perdendo a chance de escrever uma edificante história de acesso à terra no Brasil em decorrência do descaso como é tratada a questão da reforma agrária. A reforma agrária é um imperativo social. Ao fazê-la, reduz-se o empobrecimento no campo, contêm-se o êxodo rural e freia-se a concentração de terras. Tudo isso permite atenuar o histórico quadro de desigualdades e injustiça social. O lugar do homem sempre foi e sempre será a terra. Por sinal, a origem da palavra “homem” vem de “homo”, derivada de “húmus” que significa “terra”. Somos, pois, da terra; “filhos da terra”.
Marcus Eduardo de Oliveira é economista, professor e especialista em Política Internacional pela (Universidad de La Habana – Cuba)
A relação nada amistosa entre a economia e a natureza fez surgir, em meados da década de 1960, explicações técnicas que procuravam dar conta da imprescindível necessidade de mudar o processo econômico-produtivo. Àquela altura vislumbrava-se claramente que as constantes agressões ao meio ambiente, fruto da expansiva atividade econômica que fere as fronteiras do ecossistema, geram consideráveis passivos ambientais. Foi no calor dessas discussões que surgiu uma nova visão da teoria econômica que envolvia tanto a biologia quanto a física: a bioeconomia.
O que seria isso? Bioeconomia se configura na base científica da economia. Na essência, pode-se defini-la como um conceito de desenvolvimento que pressupõe novas relações com o meio ambiente, com o planeta Terra em si e com as pessoas.
Federico Chicchi, sociólogo italiano e um dos mais preparados estudiosos desse assunto, aponta que “a bioeconomia refere-se ao processo de captura da vida e à produção da própria vida no interior das regras do discurso econômico”.
Para René Passet, outro renomado especialista no assunto, a bioeconomia é o “novo paradigma da economia”. Esse pensador francês destaca que o conceito de bioeconomia surgiu como conseqüência do alerta ecológico dos anos 1960/70, que descobriu o processo econômico como uma extensão da evolução biológica.
A termodinâmica e a biológica são os seus fundamentos. O objetivo, diz Passet, “é integrar as atividades econômicas nos sistemas naturais porque as leis da macroeconomia não se reduzem às da microeconomia”. O interesse geral é muito mais do que a soma das partes. Os mecanismos naturais (como o ar, a água, o solo) não têm que ver com as leis de mercado; por sinal, problemas com esses bens comuns e naturais transcendem a lógica das nações e dos mercados. Dessa forma, na visão de Passet, a economia situa-se além de si mesma e vislumbra um novo modelo de desenvolvimento, chamado, pois, de bioeconômico. E esse modelo para se efetivar precisa ser de caráter integrador, caso contrário, malogrará.
Para enfatizar a questão esse seria um modelo capaz de conciliar os interesses públicos, privados e solidários com o interesse amplo e geral, envolvendo o que a macroeconomia tradicional tanto esquece: as pessoas e suas relações com a natureza.
Com isso, enaltecemos que a economia tem tudo a ver com um projeto de desenvolvimento que envolva as pessoas e o capital natural, caso contrário não se sustentará na linha do tempo tendendo, pois, a se desequilibrar logo mais à frente.
As pessoas e o desenvolvimento econômico e humano, em consonância com o aspecto da natureza, precisam andar juntos. Os objetivos econômicos precisam apontar para essa realização. Só há (e haverá) verdadeiro desenvolvimento socioeconômico quando as pessoas forem definitivamente contempladas. De nada adianta buscar o desenvolvimento das instituições, por exemplo, se essas não forem colocadas à disposição das pessoas. São as pessoas que fazem funcionar a economia, as instituições, e, claro, o próprio mercado.
Ademais, uma vez que esse processo macro envolve sensivelmente a participação das pessoas, nada mais normal que abordar as relações dessas para com a natureza, tendo em vista que o homem não é dono do meio ambiente, mas sim seu hóspede e, do meio ambiente depende vertiginosamente para dar prosseguimento ao curso natural da vida.
Infelizmente, esse “hóspede” tem se comportado como aquele inquilino que, descontente com o valor do aluguel, “destrói” partes de sua moradia.
Por esse prisma, a bioeconomia não deve então ser apenas entendida como uma aproximação econômica ao vivente, mas sim como uma aproximação “vivente” à própria modelagem econômica. Essa simbiose necessita ser sincronizada, uma vez que a economia nada mais é que uma atividade de transformação que tem como finalidade precípua satisfazer as necessidades humanas mais elementares. E onde estão mesmo os recursos indispensáveis para esse atendimento? É evidente que se encontra na natureza todo e qualquer recurso necessário para a produção (transformação, na verdade) de bens que suprirá as necessidades humanas. Por fim, nunca é demais aduzir que a economia intervém em três níveis: i) transformação e cálculo; ii) o nível humano; e, iii) o nível natural. Logo, a interface homem-atividade-natureza se realça a todo e qualquer instante.
(*) Economista, professor, especialista em Política Internacional com mestrado pela (USP).
É possível fazer uma economia prosperar sem que haja crescimento, sem que haja mais produção de bens e serviços? É factível ter uma vida melhor com equilíbrio e justiça social sem passar pelo aumento do estoque de produtos disponíveis no mercado?
Se entendermos que a economia é limitada pelos recursos naturais e pelos ecossistemas fica fácil aceitar que há então explicitamente limites para o crescimento, uma vez que a Terra não é capaz de sustentar elevadas produções físicas além das consideradas normais e, crescer, nesse caso, seria antieconômico e contraproducente.
Contudo, se concordarmos com a prédica dos economistas convencionais de que os recursos naturais são meras ocorrências de externalidades, que todo e qualquer impacto na natureza em decorrência da atividade produtiva expansiva é uma questão tão somente de ordem periférica e que a inovação tecnológica, um belo dia qualquer, suprirá a atual limitação natural, então, crescer, nesse caso, é a única receita viável para se alcançar elevados padrões de bem-estar e de melhoria acentuada das condições de vida.
Diante disso, o debate está posto à mesa. De um lado, os economistas ecológicos pontuam continuamente que o planeta não tem capacidade de sustentar a vida nesse ritmo avssalador de consumo, pois as mudanças climáticas, a perda da biodiversidade, o esgotamento dos recursos naturais e o desaparecimento de ecossistemas estão indo à exaustão. Quem está desse lado do debate se posiciona de forma contrária ao crescimento sem limites, uma vez que isso seria potencialmente emissor de gases capazes de aquecer ainda mais o planeta, fruto do desrespeito aos limites biofísicos do meio ambiente.
Do outro lado do debate, há quem defenda que chegaremos em breve a praticar com eficiência o uso dos recursos, preservando – e não destruindo -, a riqueza natural. Quem está desse lado diz que é justamente o crescimento, vindo da inovação e de tecnologias avançadas que fará a prosperidade aumentar e que ultrapassando as fronteiras ecossistêmicas nada acontecerá de mais grave ao conjunto da vida social.
Esse debate se acirra a partir do seguinte ponto: crescimento não significa (e nunca significou) desenvolvimento. Crescimento é a expansão das bases físicas da economia (fazer mais), o que significa aumentar a pressão sobre os recursos naturais, ao passo que desenvolvimento é assegurar melhorias nas condições de vida – viver melhor. O primeiro conceito – como é natural supor – se prende ao lado quantitativo (mais); já o segundo se refere ao aspecto qualitativo (melhor).
Estudos recentes indicam que a economia global tem hoje cinco vezes o tamanho de meio século atrás. Continuando com esse ritmo de produção, no ano de 2100 terá 80 vezes esse tamanho. Pior: esse exagerado crescimento econômico atingido até agora distribuiu pessimamente os recursos. Atualmente, um quinto da população mundial recebe meros 2% da renda global.
Assim, a ideia de prosperar não encontra fundamento no princípio do crescimento. Corroborando com isso, ao menos dois renomados especialistas tem recomendado modelos econômicos e estilos de vida que priorizam o lado qualitativo.
Peter Victor, o primeiro deles, é o autor de Managing Without Growth . Ao estudar o modelo de desenvolvimento para o Canadá no decorrer dos próximos 30 anos, Victor assegura que é possível prosperar sem crescer. De que forma? Criando um modelo econômico que seja capaz de equilibrar a capacidade produtiva da economia com o nível de gastos para que haja pleno emprego, sem necessariamente manter a economia expandindo ao longo do tempo. O que o modelo faz é empregar os benefícios de um aumento de produtividade na forma de mais lazer – vida melhor. Nas palavras de Victor: “Assim, podemos nos tornar mais produtivos sem ter de produzir mais, apenas trabalhar menos. Desde que haja distribuição, é possível ter muito menos desigualdade, sem crescimento”.
Outro renomado especialista no assunto é Tim Jackson, autor de Prosperity without Growth – Economics for a Finite Planet para quem “os dias de gastar dinheiro que não temos em coisas das quais não precisamos para impressionar as pessoas com as quais não nos importamos chegaram ao fim”. Jackson afirma que o mais importante é procurar viver bem, e não viver com mais. Nas palavras de Jackson: “Viver bem está ligado à nutrição, a moradias decentes, ao acesso a serviços de boa qualidade, a comunidades estáveis, a empregos satisfatórios. A prosperidade, em qualquer sentido da palavra, transcende as preocupações materiais. Ela reside em nosso amor por nossas famílias, ao apoio de nossos amigos e à força de nossas comunidades, à nossa capacidade de participar totalmente na vida da sociedade, em uma sensação de sentido e razão para nossas vidas”.
Como vimos, o debate está lançado. Acima de tudo, que a vida e o planeta sejam respeitados. Assim, todos nós agradeceremos.
Marcus Eduardo de Oliveira é economista, com especialização em Política Internacional (USP). Professor de economia da UNIFIEO e da FAC-FITO (São Paulo)
“A Terra está agonizando… a sua doença é causada, sobretudo, pelos maus-tratos dados pela humanidade”.
(James Lovelock)
Numa época de crise ambiental em decorrência da insensatez humana que faz a Terra agonizar, ao menos duas perguntas são pertinentes: como ter saúde em um planeta doente que convive com uma economia destrutiva e potencialmente emissora de poluentes? e como foi que o planeta ficou “doente”?
Pelo menos desde o Neolítico (12.000 anos a.C.) a humanidade vem consumindo tudo aquilo que conhecemos por recursos da natureza. Esse consumo, especialmente nos últimos cem anos, tem se dado de forma agressiva. O motivo? Busca-se a qualquer custo atingir crescimento econômico, pois isso, pelas lentes da economia tradicional, é entendido como sinônimo de progresso. Para obter crescimento, usam-se então as ferramentas de uma economia cada vez mais destrutiva: derrubam-se árvores, queimam-se florestas, agride-se o solo, derrubam-se geleiras, polui-se o ar, a água e destroem-se os mais essenciais serviços ecossistêmicos.
Não há margem à dúvida que a atividade econômica tem sido agressiva e perniciosa no que tange a extrair recursos, levar ao processo produtivo e, pós-consumo soltar resíduos comprometendo, grosso modo, a capacidade do planeta Terra em lidar com tal situação.
Em outras palavras, isso se chama economia destrutiva de recursos naturais. Em nome do propagado crescimento econômico – como se não houvesse limites para tal – o mundo moderno fecha os olhos a uma questão primordial: não se leva em conta que a biosfera é finita, limitada e hermeticamente fechada.
Portanto, qualquer tentativa em extrapolar essa situação gerará pesados passivos ambientais. Do outro lado, contudo, as forças mercadológicas impõem suas vontades. Assim, o mercado pressiona e exige mais crescimento num mundo econômico cada vez mais insustentável. Cria-se com isso uma espécie de conflito irresponsável que põe a vida de todos em perigo. É assim que a economia destrutiva vai se apresentando pondo em lados opostos duas situações básicas: a referida necessidade de crescimento econômico versus a capacidade da Terra em oferecer condições suportáveis para tal prática. E justamente no meio desse conflito é que nos encontramos. Pior ainda: a cada dia mais e mais gente vai chegando à espaçonave Terra. Descontadas as mortes, temos a cada dia 200 mil novas almas chegando ao mundo. Ao ano, são mais de 70 milhões de novos habitantes no planeta Terra que não aumentará de tamanho. Os números ilustram bem essa situação: em 1900, havia 1,5 bilhão de pessoas no mundo. Hoje, dividimos o mesmo espaço no planeta Terra com 7 bilhões de pessoas.
E o consumo? Ah, esse não para de crescer. Atualmente, apenas 20% da população mais rica do mundo utilizam ¾ dos recursos naturais, numa situação em que metade da população (3,5 bilhões) está na pobreza, nos limites da sobrevivência. É o consumo exagerado de um lado convivendo com a escassez de bens. Nesse conflito, os recursos se exaurem, o planeta adoece, a natureza se enfraquece, a vida se degrada.
Na era dessa economia destrutiva, Lester Brown em Eco-Economia: Construindo uma economia para a Terra relata que “na China os lençóis freáticos diminuem 1,5 metros ao ano. No mundo, as florestas estão encolhendo mais de nove milhões de hectares ao ano. O gelo do Mar Ático, apenas nos últimos 40 anos, reduziu-se em mais de 40%”.
O caso da água pótavel, para ficarmos apenas nesse exemplo, é gritante. Sabe-se que a quantidade de água doce disponível na Terra é de apenas 0,5% do total das águas, incluindo as calotas polares geladas. Devido à urbanização intensa, os desmatamentos e a contaminação por atividades industriais e agrícolas (bases do modelo que recomenda o crescimento econômico sem limites), mesmo esta pequena quantidade de água está diminuindo, causando a desertificação progressiva da superfície da terra. Como agravante, o consumo de água em consequência da urbanização dobra a cada 20 anos.
Se centenas de milhões de pessoas carecem de acesso à água potável, por outro lado continua o consumo de desperdício desse precioso líquido por parte dos mais afortunados que podem pagar pelo serviço. Vejamos que enquanto regiões imensas na África, Ásia e América Latina carecem de recursos hídricos mínimos, nas regiões “desenvolvidas”, além do excesso de consumo, aumenta a poluição de rios, lagoas e lençóis freáticos e aqüíferos subterrâneos; tudo isso em nome do crescimento econômico que parece, de fato, não encontrar freios à sua expansão. Enquanto lençóis freáticos caem assustadoramente de um lado, principalmente nas três maiores áreas produtoras de alimentos (China, Índia e EUA), do outro se queimam florestas, expandem-se desertos e aumentam-se consideravelmente os níveis de dióxido de carbono. Os rios estão ficando às mínguas. O principal rio dos Estados Unidos – o Colorado – mal chega ao mar. O Nilo já apresenta enorme dificuldade em atingir o Mediterrâneo.
Não obstante a isso a economia continua sua sanha exploratória e destrutiva queimando petróleo, gás e carvão, derrubando e queimando florestas, contribuindo sobremaneira para o aquecimento global.
Parece mesmo que o sistema econômico desconhece que esquentando o planeta, esquentam os mares e aumenta-se a evaporação das águas. Conclusão: O gelo dos polos vai derreter elevando o nível dos mares, alterando assim as correntes marítimas. O nome disso? Desastre ecológico! A causa disso? Modelo econômico destrutivo!
Alguns anos atrás, num esclarecedor e aterrorizante artigo intitulado “O Programa Suicida da Economia”, o ensaísta alemão Robert Kurtz alertou que as condições elementares da vida, como a água, o ar e a terra, estão expostos a um crescente processo de envenenamento. A camada protetora de ozônio na atmosfera é corroída. Diz Kurtz que “no Sul da Argentina e na Austrália, uma infinidade de ovelhas já pasta com cancros à mostra. Os desertos avançam dia a dia e há prognósticos de que a guerra do século 21 terá como estopim o controle de mananciais hídricos”.
São as mudanças climáticas, manuseadas por mãos humanas que faz adoecer gravemente o planeta. Tomando nota dos últimos dados apontados no Relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática (IPCC) localizamos ao menos três danos em decorrência das mudanças climáticas: 1°) Derretimento das geleiras eternas do topo de montes como Fuji, no Japão, e Kilimanjaro, na Tanzânia: os rios dos vales no entorno dos picos são alimentados pelo degelo da neve no verão. Seu volume está diminuindo, prejudicando assim a irrigação de culturas agrícolas e a produção industrial que depende da água; 2°) Derretimento das calotas polares no sul e no norte: pedaços de gelo de água doce alteram a salinidade do mar, causando mudanças no clima e na cadeia alimentar. O urso polar, por exemplo, já tem dificuldade para achar comida e; 3°) Savanização da Amazônia: se a devastação continuar por causa da pecuária, das fazendas de soja e da extração de madeira, e o clima esquentar, a floresta vai virar um cerrado (terreno plano, com trechos de seca). Com isso, várias espécies locais vão acabar. E, sem a força do “pulmão do planeta”, a emissão de gases poluentes ganhará força, prejudicando e adoecendo mais ainda a Terra.
Catastrófico e preocupante também é o fato de que essa mudança climática acontece com voracidade no momento em que o processo de globalização se traduz (ao menos para seus defensores) como política capaz de oferecer progresso a todos.
Na essência dos fatos, atentemos ao seguinte: Para abastecer as geladeiras do mundo moderno, fere-se a atmosfera numa escala sem precedentes.
Os exorbitantes custos do transporte de carros, caminhões, navios e aviões nesse “intercâmbio produtivo” para levar diversos produtos às geladeiras mais distantes não se leva em conta que é altamente emissor de poluentes.
Á título de exemplo é oportuno dizer que apenas nos Estados Unidos circulam 80 veículos para cada 100 habitantes (aproximadamente 250 milhões); na Alemanha são 55 por 100 habitantes e índices semelhantes são encontrados em outros países desenvolvidos somando quase um bilhão de veículos a motor hoje alimentados por petróleo.
Quanto às “viagens” dos produtos de um lugar para outro, em nome dessa globalização que pretende estreitar fronteiras, atentemos ao exemplo de um frango congelado nos Estados Unidos que viaja, em média, 3.000 milhas antes de ser consumido.
Na Alemanha, estudos realizados apontam que um pote de iogurte de morango produzido nesse país acumula cinco mil quilômetros de transporte. O leite vem do Norte da Alemanha, o morango vem da Áustria, o pote é francês e o rótulo vem da Polônia. A Noruega manda bacalhau para a China. As ervilhas consumidas na Europa são cultivadas e embaladas no Quênia. O kiwi, uma fruta natural da Nova Zelândia encontra mercado nos Estados Unidos que, por sua vez, é comprada da Itália. Essa fruta nas mãos da empresa Sanifrutta, exportadora italiana, viaja por mar em contêineres refrigerados: 18 dias até os Estados Unidos, 28 dias até a África do Sul e mais de um mês para chegar de volta à Nova Zelândia.
O Reino Unido vende anualmente vinte toneladas de água engarrafada para a Austrália. Esse mesmo Reino Unido consome uvas vindas da África do Sul, a erva-doce vem da Espanha e a abóbora, da Itália.
As batatas Pringles, fabricadas pela Procter & Gamble, por exemplo, atualmente são vendidas em mais de 180 países, apesar de serem fabricadas apenas em alguns poucos lugares. Isso é simplesmente a “orgia do desperdício e do custo” em termos de poluição, especialmente o dióxido de carbono.
Esse aparente “custo invisível” se “esconde” nas sombras dos menores custos produtivos e dos salários baixos, não importando a localidade para onde vai o produto. O que conta nesse caso são os ganhos monetários em detrimento da própria sustentabilidade ambiental.
Em nome do progresso econômico (será mesmo isso progresso econômico?) a poluição dá as caras e vai aos poucos ceifando vidas. Baseando-se apenas nos custos advindos da poluição nota-se que apenas fora das fronteiras de uma cidade como São Paulo, conforme estudos do Laboratório de Poluição da Universidade de São Paulo (USP), consome-se a importância de R$ 14 por segundo (R$ 459,2 milhões anuais) para tratar seqüelas respiratórias e cardiovasculares de vítimas do excesso de partícula fina – poluente da fumaça do óleo diesel. Esse valor é dispensado por unidades de saúde públicas e privadas de seis regiões metropolitanas do país. O caso específico da cidade de São Paulo merece maior atenção. Todos os dias 8,2 toneladas de poluentes são despejados sobre a cidade. São mais de 3 milhões de toneladas/ano, 90% delas provenientes de veículos automotores, queimando petróleo, adoecendo o planeta.
Nas seis regiões metropolitanas do país, esse quase meio milhão de reais que são gastos serve apenas para tratar de questões relativas à poluição advindas, em especial, do intenso trânsito (leia-se: congestionamento) nas grandes cidades que diariamente nos “brindam” com emissões de poluentes diversos e seus resultantes: Monóxido de Carbono (CO), que causa tonturas e dores de cabeça; Hidrocarbonetos (HC) que contribui para a irritação nos olhos, nariz, pele e parte do sistema respiratório; Óxido de Nitrogênio (NOx) com irritação e contrição das vias respiratórias e, Materiais Particulados (MP). Dito isso, prevalece à pergunta inicial: Como ter saúde em um planeta doente que convive com uma economia destrutiva altamente emissora de poluentes?
Marcus Eduardo de Oliveira é economista, com especialização em Política Internacional (USP). Professor de economia da UNIFIEO e da FAC-FITO (São Paulo)
A declaração a seguir, proferida na década de 1940, é de Albert Einstein: “Olhem as abelhas, se elas sumirem a humanidade tem um máximo de quatro anos de sobrevida, pois não haverá plantas e nem animais. A polinização é a grande responsável pela produção de alimentos”.
Há 80 milhões de anos as abelhas desempenham a crucial tarefa de polinizar plantas. A polinização é a transferência de grãos de pólen (gameta masculino) das anteras (órgãos masculinos) de uma flor para o estigma (parte do aparelho reprodutor feminino) da mesma flor ou de outra flor da mesma espécie. Sem essa transferência, não há a fecundação das plantas e, sem plantas, não há, simplesmente, como alimentar o mundo. Sem esse processo não há a formação das sementes e frutos. São as abelhas em seus 55 dias de vida apenas (abelhas operárias) que garantem a diversidade e o equilíbrio do ecossistema.
Estudos apontam que 50% da biomassa de uma floresta tropical seja formada por formigas, vespas, abelhas e cupins. Assim como as abelhas, também as formigas exercem fundamental papel no equilíbrio do ecossistema. Elas influenciam fortemente os ecossistemas, uma vez que são importantes na incorporação de nutrientes ao solo e na sua aeração, atuando ainda como predadoras de outros organismos, permitindo a regulação da diversidade no ambiente. O desaparecimento de grande parte de abelhas e formigas poderia anunciar uma catástrofe ambiental.
Especificamente em relação às abelhas, estudos elaborados recentemente por pesquisadores da Universidade de Cornell (EUA) apontam que 1/3 dos alimentos que consumimos são diretamente dependentes do papel delas na natureza. Além disso, mais de 80% dos alimentos consumidos pela humanidade são polinizados pelas mesmas. O aumento da quantidade de frutos e sementes em decorrência da polinização permite obter a qualidade de diversos ecossistemas.
Entretanto, a agressão ambiental verificada em escala cada vez mais acentuada atinge em cheio essa riqueza natural. Pelas mãos dos homens, o desmatamento, a poluição, as queimadas, os incêndios florestais, o uso indiscriminado de agrotóxicos (especialmente quatro tipos deles: imidacloprido, tiametoxam, clotianidina e fipronil) e a ação de meleiros (pessoas habilidosas em encontrar enxames) tem colocado a vida das abelhas em condição de perigo. Sem as abelhas ficaremos sem frutos, legumes, nozes, óleos e algodão. No tocante aos agrotóxicos, empresas químicas poderosas estão fazendo nos bastidores do poder forte lobby para continuar vendendo esses venenos.
Por conta desses agravantes, nos últimos 15 anos tem-se notado considerável aumento da mortalidade das abelhas, em especial na região sul do país, o que se configura numa situação muito preocupante. Sem a força retórica da expressão, o certo é que o sumiço das abelhas mudaria completamente todo o ecossistema, afetando significativamente a vida de todos nós.
Como bem aponta Marcelo Boroviak, as abelhas são seres fundamentais para a manutenção da vegetação natural e cultivada, pois contribuem para a perpetuação de muitas espécies nativas e de culturas agrícolas. Sua preservação é importante devido ao papel fundamental que desempenham na cadeia biológica: fazer a polinização e garantir, dessa forma, a continuidade das espécies de flores de onde insetos e outros animais retiram seu alimento. O alerta está dado: vamos olhar com mais atenção para isso.
Marcus Eduardo de Oliveira é economista e ambientalista, com mestrado pela Universidade de São Paulo (USP).
A economia só faz sentido se for usada para servir as pessoas. O objetivo central da política macroeconômica em países que já atingiram elevado patamar de prosperidade e bem-estar não pode ser explicitamente o crescimento econômico. A economia precisa respeitar os limites físicos impostos pela natureza e reconhecer que se trata apenas de um subsistema da bioesfera finita que lhe dá suporte. A abundância material, fruto da expansão produtiva sem limites, não é promotora de bem-estar, posto que um aumento na oferta de bens e serviços agride a biodiversidade, colocando o próprio bem-estar na berlinda. Impor limites ao crescimento não significa travar a atividade produtiva. A energia física e os serviços energéticos desempenham papéis preponderantes na produtividade e no crescimento da economia. É absolutamente imprescindível colocar a vida econômica a serviço do desenvolvimento social, proporcionando, com isso, duplo alcance: aumento das oportunidades e das liberdades. Urge promover a conciliação entre a economia e o meio ambiente e extirpar o pensamento econômico tradicional que recomenda o crescimento econômico a qualquer custo. Os agentes econômicos não são os donos da Terra, mas sim seus hóspedes. Não podemos mais fingir que vivemos em um ecossistema ilimitado. O crescimento econômico permanente é impossível de ser alcançado e é perfeitamente possível alcançar prosperidade sem crescimento (prosperity without growth). O eixo central da economia não pode ser o mercado e, o objeto, a mercadoria, mas, sim, o indivíduo e suas necessidades elementares convivendo pacificamente com a natureza e enaltecendo que a vida social depende de um conjunto de serviços ecossistêmicos. O ritmo econômico atual baseado na exploração desenfreada de recursos naturais e no superconsumo é insustentável e contraproducente. A práxis econômica deve ser buscada no sentido de ser solidária, participativa e coletiva, trocando o atual modelo econômico baseado na competição-disputa pelo modelo de cooperação-partilha. O objetivo primordial da atividade econômica em países atrasados socialmente não deve ser a produção de riqueza, mas, antes, proporcionar bem-estar às pessoas a partir da eliminação dos focos geradores de pobreza e miséria. A transição para uma economia de baixo carbono com preservação e valorização da biodiversidade é a nossa única saída.
Todas essas ponderações, sem exceção, sopram em ventos contrários à ordotoxia econômica. Tais argumentos ferem sensivelmente o tradicional pensamento econômico. Todas as colocações acima refutam a literatura contida nos manuais de Introdução à Economia usados corriqueiramente nos cursos universitários. Esses manuais, por sinal, insistem em defender uma economia hermeticamente padronizada, além de propagarem a prática do individualismo em economias centradas apenas e, tão somente, na valorização dos ganhos máximos. Pouco, ou quase nada, é expresso em termos da valorização do indivíduo, do respeito aos limites físicos e naturais e de uma economia voltada ao bem-estar coletivo que incorpore à temática da economia verde, da economia azul, da economia estabelecida no baixo carbono.
Para afirmar positivamente essas últimas impressões, a sociedade moderna tem contado com relevantes contribuições de renomados especialistas. Especialmente no tocante às questões envolvendo a atividade econômica e sua relação com o meio ambiente um dos mais argutos pensadores do momento, autoridade-mor no assunto economia ecológica, é o professor da Universidade de Maryland, Herman Daly. Daly, em seus 93 anos de idade, tem insistido veementemente sobre a necessidade de se levar em conta os efeitos da atividade econômica sobre os recursos naturais não renováveis.
Para ele, adentramos no processo do “crescimento deseconômico”, ou seja, aquele crescimento que pela expansão da economia afetou excessivamente o ecossistema circundante sacrificando o capital natural (peixes, minerais, a água, o solo, o ar…). Nas palavras de Daly: “o crescimento deseconômico é um crescimento que começou a custar mais do que vale – um crescimento (seja em volume de produção ou PIB) para o qual os custos adicionais (incluindo os custos ambientais e sociais) são maiores do que os benefícios adicionais em termos de produção”.
Assim, Daly salienta que uma vez ultrapassado a escala de crescimento ótimo, esse crescimento torna-se custoso e estúpido no curto prazo e impossível de ser mantido no longo prazo. Portanto, já passou da hora de buscarmos as condições necessárias para a reversão desse jogo. No entanto, a receita econômica tradicional contradiz esse pensamento ao referendar e insistir na tese de que é necessário fazer com que a economia produza cada vez mais, afinal, um belo dia esse crescimento excessivo chegará às nossas mãos em termos de mais produtos disponíveis no mercado de consumo e, por conta disso, seremos então mais felizes. Será isso saudável? Respondendo: É claro que não! Há algo que essa tradicional e velha teoria econômica ainda não se deu (ou finge não se dar) conta: existem limites! E esses, por sua vez, não significam a paralisia da atividade econômica como argumentam os defensores do modelo antigo. Parar de crescer (economicamente) não significa parar de se desenvolver (social e ambientalmente). É justamente por isso (e para isso) que uma nova economia precisa emergir para enterrar de uma vez por todas a ideia dominante da teoria econômica convencional que apenas confere importância e relevância para a escala de se produzir mais, não ponderando que aumentar a quantidade (crescimento) não resultará como contrapartida em qualidade (desenvolvimento).
É, pois, pela qualidade – base real de uma economia sustentável ambientalmente – e não pela quantidade, que o economista e ambientalista chileno Manfred Max-Neef vem lutando para implantar novos modos de produção econômica em que as pessoas sejam alçadas em primeiro plano, em lugar dos objetos e do mercado, fazendo ainda com que a questão ecológica tenha relevância ímpar na modelagem econômica. Para Max-Neef, o crescimento econômico está alinhado à qualidade de vida das pessoas até certo ponto. Ultrapassado esse ponto, não há ganhos, mas perdas; não há benefícios, mas custos, sendo o principal deles a deterioração da qualidade de vida.
Esse argumento dá embasamento teórico ao que Max-Neef chama de “Teoria do Umbral”. Umbral, em algumas tradições religiosas, é uma região pesada, densa, suja e tenebrosa em que habitam espíritos inferiores e sofredores. Para Max-Neef, em economia, de forma alusiva e metafórica trata-se da “região” em que acontecem os custos excessivos decorrentes do processo produtivo buscado sem o respeito aos limites naturais. Custos esses que não são quantificados, mas sentidos por todos, tais como a poluição das águas, do ar, dos solos, a degradação ambiental, a emissão de gases que contribuem para o efeito estufa. Max-Neef entende ser possível sair da região umbralina em direção ao paraíso econômico buscando uma economia “saudável e equilibrada” a partir de seis postulados:
1. A economia está para servir as pessoas, e não as pessoas para servir a economia;
2. O desenvolvimento se refere a pessoas, e não aos objetos;
3. O crescimento não é o mesmo que desenvolvimento, e o desenvolvimento não precisa necessariamente de crescimento;
4. Nenhuma economia é possível à margem dos serviços que prestam os ecossistemas;
5. A economia é um subsistema de um sistema maior e finito, que é a biosfera e, portanto, o crescimento permanente é impossível; e,
6. Nenhum processo ou interesse econômico, sob nenhuma circunstância, pode estar acima da referência à vida.
Dessa forma, nota-se que a realidade econômica atual recomendada pelos manuais econômicos tradicionais corre em direção contrária a esses princípios. Talvez seja exatamente por esses ensinamentos tradicionais que o “atual modelo econômico mundial é um pacto de suicídio global” para usarmos as palavras de Ban Ki-Moon, secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU).
Que tenhamos então coragem necessária para refletir sobre isso e determinação suficiente para cobrar das autoridades econômicas políticas públicas que sejam capazes de promover a mudança necessária desse jogo econômico, mudando o modelo econômico atual para uma economia de baixo carbono, com geração de empregos verdes. O placar final desse jogo certamente será uma goleada em favor da qualidade de vida e da conquista definitiva do bem-estar.
Marcus Eduardo de Oliveira é economista e professor. Mestre em Integração da América Latina (USP) e especialista em Política Internacional (FESP), com passagem pela Universidad de La Habana – Cuba.
Em decorrência do agravamento da crise econômica na Zona do Euro e da forte desaceleração da atividade econômica mundial, se as previsões da Organização Internacional do Trabalho (OIT) se confirmarem, ao término deste ano teremos ultrapassado no mundo a barreira dos 200 milhões de desempregados.
Contudo, esse cenário desolador da economia mundial pode ser atenuado pondo-se em prática algo que tão urgentemente necessitamos: gerar empregos verdes (green jobs) a partir da transição para uma economia de baixo carbono; para uma economia que se desenvolva qualitativamente sem impactar, que cresça moderadamente sem destruir, que se paute na ética de valores de desenvolvimento sustentáveis, protegendo a flora, a fauna, reduzindo o consumo de recursos naturais, de energia e de água.
Isso somente será possível com a prática de uma nova economia que respeita o meio ambiente e reconheça a necessidade de reduzir as emissões de gases que provocam o efeito estufa, respondendo afirmativamente pela geração de empregos em áreas-chave da sustentabilidade.
Dessa forma, ao menos uma boa parte da geração de empregos já pode ser encontrada nos empregos verdes, ou seja, na ocupação de mão de obra que procura proteger e restaurar os ecossistemas e a biodiversidade (no Brasil já são 3 milhões de postos), com destaque para a área de energias renováveis, agroecologia, proteção de áreas de conservação, biocombustíveis e construção civil, usando nesse último caso, de acordo com estudos da própria OIT, a eficiência energética em prédios residenciais e industriais, com construções mais inteligentes que usem menos energia, água e materiais, estando assim em sintonia à ideia de cidades sustentáveis.
Fora isso, dentro da perspectiva dessa nova economia que obrigatoriamente deve colocar no centro das decisões a questão ambiental, fazendo a interface entre economia e ecologia, permitindo com que a atividade econômica gire em torno dos ecossistemas, derrubando, assim, o cabedal teórico da economia neoclássica que leva em conta o meio ambiente apenas pela ótica da externalidade, há um amplo conjunto de atividades que são potencialmente geradoras desses empregos ambientalmente equilibrados e favoráveis à qualidade de vida.
Essas atividades necessariamente passam pela descarbonização da atividade econômica. Dentre essas, destacam-se: a agricultura orgânica (com o desenvolvimento de compostagens e adubação orgânicas – transformação de resíduos em húmus), o turismo ecológico e de aventura (englobando patrimônios culturais e as belezas naturais), a reciclagem de resíduos (com a normalização dos catadores de materiais e criação de cooperativas), o setor de energia solar, atividades de apoio à produção e manejo florestal (dados da OIT – base 2009 – apontam que esse setor emprega 12,9 milhões de trabalhadores em todo o mundo), geração e distribuição de energias renováveis, saneamento, gestão de resíduos, processamento e distribuição de gás natural, atividades paisagísticas, caça e pesca, horticultura e floricultura.
Especificamente no setor de transportes, cabe destacar como bons postos de empregos verdes o marítimo de cabotagem, por navegação, de travessia, ferroviário de carga, metroferroviário de passageiros, além da construção de embarcações e estruturas flutuantes. Outro setor que responde muito bem pela geração de vagas no mercado de trabalho é o do cultivo da cana de açúcar para produção de etanol; resguardando-se, nesse caso, os impactos negativos sobre o meio ambiente, tais como a exaustão dos solos, degradação das matas, assoreamento e a poluição dos rios. Com isso, os empregos verdes além de contribuírem para a redução de emissões, melhorando sensivelmente a qualidade ambiental, servem de atenuante aos efeitos maléficos do desemprego sobre a atividade econômica como um todo.
Marcus Eduardo de Oliveira é economista e professor, com especialização em Política Internacional e mestrado em Integração da América Latina (USP).
Desde seu surgimento pelas mãos de John Keynes, a macroeconomia tem como objetivo central o crescimento econômico à espera dos sufocantes padrões de consumo. De forma equivocada, muitos ainda acreditam que a abundância material “produz” bem-estar e permite melhorar substancialmente a vida das pessoas, cabendo à atividade econômica ser a protagonista principal desse filme cujo enredo é conhecido: manda quem pode (as forças de mercado) e obedece quem tem juízo (o bolso dos consumidores).
No afã em se produzir a qualquer preço para o atendimento das propagadas necessidades humanas – cada vez mais ilimitadas – a política econômica faz o jogo do mercado e, assim, contribui para transformar artificialmente desejos em necessidades. Para isso, põe a roda da economia para girar com mais força visando o alcance de taxas mais elevadas em termos de produção de bens e serviços; afinal, apoiada por ampla propaganda televisiva, o consumo precisa acontecer para o regozijo da classe produtora.
Mas, como nem tudo que reluz é ouro, nesse meandro produção-consumo não há como refutar uma assertiva: para crescer economicamente (produzir mais) é necessário usar o meio ambiente (fatores naturais) e, em decorrência desse “uso” crescer significa, grosso modo, “destruir”.
Assim, essa premissa pode ser reescrita de outra forma: Consome-se, logo, destrói-se. Produz-se mais, logo, agride-se mais.
Pois bem. Numa sociedade centrada no uso e na força do dinheiro como mecanismo potencializador de qualquer consumo temos a premissa de que “o consumo consome o consumidor”, como diz profeticamente Frei Betto em “A Mosca Azul”.
Diante disso, uma crucial e instigadora pergunta se apresenta como pertinente: como produzir mais para satisfazer desejos e necessidades de consumo se há visivelmente limites e pré-condições impostas pela natureza que impossibilitam esse atendimento em escala crescente?
Como existe o desejo em prontamente atender as necessidades mercadológicas impostas pelo apelo consumista, que por sinal são cada vez mais vorazes, primeiramente, em respeito ao bom senso, deve-se ter em conta aquilo que Clóvis Cavalcanti, especialista em economia ambiental, chama a atenção com bastante veemência: “mais economia implica menos ambiente”.
Isto posto, se é verossímil o fato de que o consumo consome o consumidor, a macroeconomia do consumo consome a natureza e, por esse “consumismo” desenfreado de recursos naturais (limitados, finitos) por parte da atividade econômico-produtiva, em breve, sem exageros retóricos, não haverá mais natureza, não haverá mais economia, mais mercado, produtos, consumidor, vida.
Em nome do “crescimento econômico” a destruição ambiental tem se apresentado com mais veemência nos últimos tempos, ainda que muitos insistam em fechar os olhos para tal questão. O certo é que mais produção material – com a atual matriz energética largamente usada – hoje em dia se traduz como sinônimo de mais emissões de gases de efeito estufa. É imprescindível conter o total dessas emissões, caso contrário, elevando-se a temperatura média do planeta teremos mais enchentes, derretimento de geleiras, mais secas.
Na esteira dessa análise, a economia tradicional beira a cegueira e incorre no crasso e estúpido erro ao confundir e não diferenciar crescimento (quantitativo) de desenvolvimento (qualitativo). De um lado, têm-se a receita tradicional da macroeconomia keynesiana: buscar o crescimento econômico para atenuar os desequilíbrios em relação à taxa de emprego e renda. Do outro, têm-se a questão ecológica que ressalta a não existência de recursos naturais em quantidades disponíveis para a ocorrência desse tal crescimento. O que não se coloca claramente é que crescimento econômico, como diz Ricardo Abramovay em “Muito Além da Economia Verde”, não é uma fórmula universal para se chegar ao bem-estar. Não se nega a importância do crescimento da economia; o que não se pode é fazer dele uma “finalidade”, pois o mesmo é apenas um “meio” para que a vida econômica prospere.
Desse embate teórico, algo tem de ficar bem esclarecido: uma maior produção econômica irá derrubar mais florestas, irá agredir o solo, usar mais água, o ar, a energia, teremos mais aumentos de emissões globais de gases de efeito estufa e teremos, sim, a vida colocada em risco pelo desequilíbrio climático decorrente disso tudo. Continuando com a falta de lucidez por parte da economia tradicional, a insistência em crescer economicamente além dos limites significa ainda aumentar o intercâmbio global de produtos, base essa do atual e avassalador modelo de globalização que recomenda, na ponta final, que a “receita para o sucesso” é ter sempre a geladeira repleta de produtos, de preferência importados. Ora, é simplesmente insano fazer com que um ketchup, por exemplo, vindo dos Estados Unidos “viaje”, às vezes, mais de 10 mil quilômetros para chegar ao mercado brasileiro quando poderia ser produzido domesticamente e “viajar” menos de 1.000 km para chegar às mesas dos brasileiros.
No entanto, para esse modelo de globalização que corre às soltas atestando que o produto importado é a característica mais visível da modernidade, pouca relevância tem o gasto energético intenso envolvido nessa “viagem” de fora para cá do ketchup. Pouco importa se isso é altamente agressivo sobre o meio ambiente e potencialmente gerador de CO2.
Nessa mesma linha de raciocínio, vejamos outro exemplo de como o consumo consome o consumidor e junto a isso a economia consome a natureza pondo a estabilidade climática à beira do precipício: a fruta nectarina produzida em Badajoz, na Espanha, “viaja” quase 400 quilômetros de caminhão queimando combustível até chegar a Portugal, no Porto de Lisboa. De lá vem ao Brasil, chegando ao Porto de Santos vinte dias depois. Alguém consegue imaginar o quanto foi gasto em termos energéticos nesse processo? Isso é inadmissível numa sociedade que já consome em energia e recursos o equivalente a um planeta e 1/3.
Ora, acatar esse modelo de consumo desenfreado (que não passa de um parâmetro falso de bem-estar) “patrocinado” pela macroeconomia da destruição da base natural e “propagandeado” por uma estrutura midiática que movimenta bilhões de dólares e se legitima por gordos lucros é continuar jogando terra sobre a capacidade de se obter desenvolvimento sustentável, pois isso está longe de melhorar a qualidade de vida das pessoas. Ao contrário: isso apenas reforça a ideia mercadológica (e sabemos que os mercados nunca promoveram bem-estar) e potencializa o triste fato do consumo consumir o consumidor possibilitando a chegada mais rápida da era do caos em termos de qualidade de vida relacionada aos serviços ecossistêmicos.
Marcus Eduardo de Oliveira é economista e professor de economia da FAC-FITO e do UNIFIEO, em São Paulo. Mestre pela USP com passagem pela Universidade de Havana (Cuba)
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29 nov
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