O PANEMA E O PINTOR DA NATUREZA
Clerisvaldo B. Chagas, 12 de setembro de 2014.
Crônica Nº 1.259
O mestre pincelava aqui, retocava ali. Recordo com nítida clareza o quadro bucólico apreciado dos fundos das residências. Fundos das residências da hoje Rua Antônio Tavares que deslumbrava fatia urbana do rio Ipanema.
Lavadeiras pobres sob jirau de varas finas, nas areias grossas do rio seco. Palhas descoloridas pelo tempo e tecidos baratos sombreando as mulheres de cócoras à beira da cacimba.
Cem metros a montante, o botador d’água abastece as quatro ancoretas. Está ajoelhado diante da cacimba com tonel sem fundo. O caboclo vai retirando o líquido pesado com uma cuia de cabaça e passando para o funil acoplado na ancoreta. O chapéu de palha protege-o do Sol escaldante do Sertão. O jumento, ao lado aguarda pacientemente o complemento da carga e a voz conhecida do seu dono.
Ali perto, garotos jogam bola no campinho improvisado pelas últimas cheias do Panema. Lá adiante e mais acima, adolescentes caçam rolinhas que procuram a bebida dos minúsculos poços. Os garotos fazem manobras entre pedras e moitas com suas petecas improvisadas.
Uma vaca magrela muge sobre grama e ramagens.
Cavalos, burros, jumentos, pastam isoladamente presos por cordas de caroá.
Um caçador, traje em molambo, corta ao meio a paisagem bucólica com espingarda à mão.
Uma banda do céu se encurva e azula o cenário nordestino da década 1950.
O tinido do ferro na bigorna dita o ritmo do tempo no compasso que preenche o vazio do vale, do sertão, da vida encravada na simplicidade das coisas, das páginas de Deus.
Tira uma sesta o serrote do Gonçalinho, o serrote do Cruzeiro, a serra Aguda, os píncaros da Remetedeira.
O pintor vai encerrando a cena quando fiapos de brancas nuvens passam como lenços brancos, acenando para o dorso encardido do velho Panema.
* Foto histórica e rara de Laércio Luiz em:
LIMA. Ivan Fernandes. Geografia de Alagoas. 2ª ed. São Paulo, Do Brasil, 1965.
12 set
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