Atacama: Um deserto marciano no norte do Chile

19 Maio 2013 - 10:54


Atacama

Os panoramas no Atacama são de tirar o fôlego. Na foto, ao fundo, o vulcão Licancabur. À frente, vicunhas pastam a erva rala. No plano ao meio, uma das várias lagunas da região

O Atacama, no norte do Chile, é um dos desertos mais secos e elevados do mundo. Imenso, aqui e ali, surgem cactos gigantes que parecem sentinelas solitárias de braços eternamente levantados. Tufos de capim jorram do chão e são a base alimentar da vicunha, a dona-do-pedaço, uma prima do camelo que vive em bandos a vagar pelas encostas das montanhas. Nutrem também lebres e alguns roedores que, por sua vez, viram comida de raposas, de pumas, e dos condores que tudo veem lá das alturas. Não fossem esses bravos e teimosos representantes do mundo vegetal e animal, poderíamos achar que estamos na superfície do planeta Marte, exatamente como mostram as fotos enviadas pela sonda Curiosity. Só que em Marte o céu é branco acinzentado. No Atacama ele se mostra em azul incrível, até chegar ao horizonte onde, subitamente, cede lugar ao vermelho da terra.

Vçcões

Vistos à distância, os vulcôes do Atacama parecem montanhas baixas e pequenas. À medida que nos aproximamos deles, tornam-se enormes. Alguns são ativos e apresentam fumarolas

A oeste, vários vulcões da cordilheira dos Andes, alguns ativos, com seus cumes eternamente nevados, exibem penachos de fumarolas e parecem estar muito perto. Impõem respeito. Dentre eles se destaca o Licancabur, com 5.916 metros de altura. Seu nome no idioma kunza, falado pelos antigos moradores do Atacama, significa simplesmente “o homem-montanha”. Porque desde sempre, esse vulcão semiativo é venerado pelos locais como criatura viva, amiga e protetora dos humanos. Ele é uma espécie de bússola onipresente: pode ser avistado o tempo todo e orienta os viajantes, impedindo que se percam na imensidão do deserto.

Observatporio

O observatório radioastronômico ALma, instalado nas imediações de San Pedro de Atacama, foi recentemente inaugurado e é hoje o maior do mundo

A paisagem, a luminosidade e transparência do ar no Atacama são inigualáveis. De dia, haja óculos escuros, pois tudo brilha como se fosse espelho. À noite, as estrelas parecem próximas, basta levantar o braço e pode-se agarrar uma delas – pelo menos essa é a sensação que se tem. Não à toa o Atacama é sede de observatórios astronômicos internacionais. O mais importante deles é o Alma – The Atacama Large Millimeter/submillimeter Array (ALMA), inaugurado há poucos meses e parcialmente aberto à visitação. O Alma é o maior projeto existente no mundo para a observação astronômica. Seu design revolucionário obrigou a construção de 66 enormes radiotelescópios. Instalado a 5 mil metros de altitude, no Planalto de Chajnantor, esse conjunto de antenas parabólicas gigantes parece diretamente saído dos cenários de “Odisséia no Espaço”, o mítico filme de Stanley Kubrick.

Aos pés do vulcão Licancabur está o vilarejo de San Pedro de Atacama, um dos destinos top mais concorridos no Chile. Ali, a temporada turística dura doze meses. Durante o ano todo San Pedro está cheio de pessoas dos mais diferentes países do mundo. É, provavelmente, o endereço mais cosmopolita do Chile. Nas suas velhas ruelas estreitas, hoje repletas de butiques, lojas de artesanato, bares e restaurantes, agências de viagem, ouve-se uma babel de línguas estrangeiras misturadas ao espanhol local.

Rua

A Calle Caracoles, em San Pedro de Atacama, é a rua principal, cheia de butiques de artesanato e curiosidades, bares e restaurantes especializados na culinária regional e chilena

Os estrangeiros sentem e entendem o Atacama como uma região ancestral, mágica, cheia de energia telúrica, muito rica de atrativos naturais. Nela o visitante pode passar semanas e semanas em andanças contínuas e, ainda assim, não consegue visitar tudo. Claro, um lugar tão cheio de charme, tão sedutor, tem seu preço: San Pedro é um dos sítios mais caros do Chile. Mochileiros e andarilhos com pouca plata nos bolsos passam mal, pois a comida e os alimentos em geral não são baratos. Mas existem muitas alternativas de preço e qualidade, desde campings até hotéis 5 estrelas.

Uma opção excelente é a oferecida pelo Kunza Hotel & Spa, um cinco estrelas super confortável que oferece excursões e programas personalizados para que os hóspedes desfrutem de todas as maravilhas naturais da região, com total conforto. Como cada visita às atrações da região leva meio dia, o almoço geralmente é realizado in loco, gênero piquenique, providenciado pelo serviço do próprio hotel.

À noite, banho tomado, e após uma eventual sessão relax no spa – com piscinas e jacuzzis ao ar livre, sauna, banho turco, academia de ginástica, massagens e terapias – chega a hora de ir ao restaurante. Seu nome é Oásis, com cozinha internacional e regional. Vale a pena pedir ao maître que sugira alguma especialidade chilena. De preferência, como entrada, o “caldillo de congrio al estilo de Pablo Neruda”, uma delícia à base de frutos do mar e congrio, peixe abundante nas águas chilenas. O poeta Neruda gostava tanto que compôs até uma “Ode al Caldillo de Congrio” para celebrar e imortalizar o prato.

Depois do jantar, café e conhaque num dos salões junto ao bar e muita conversa com os amigos, antes de se recolher aos quartos. O Kunza dispõe de 60 apartamentos de 52 metros quadrados cada um, equipados com minibar, ar condicionado, internet gratuita, cofre digital, televisão de tela plana, sistema de segurança. E, tesouro dos tesouros, um silêncio profundo que ajuda no descanso.

Comece o programa de visitas pela própria cidadezinha de San Pedro de Atacama. Esse pacato vilarejo, considerado a capital arqueológica do país, é um oásis em meio aos vários salares que existem na região. San Pedro fica na chamada depressão pré altiplânica, a 2438 metros acima do nível do mar.

Com ruelas sem asfalto e casinhas empoeiradas feitas de adobe, uma espécie de tijolo artesanal secado ao sol, San Pedro parece ter parado no tempo. As paredes das construções têm um acabamento feito com uma mistura de barro, palha e água. Como quase nunca chove, os telhados também são feitos dessa mistura, ao invés de serem cobertos com telhas.

As construções mais antigas, como a bela igreja da vila, construída em 1774, tem o teto elaborado com madeira de cacto gigante, uma planta típica da região, prática hoje proibida para evitar a extinção da espécie.

Outra atração de San Pedro é o Museu Padre Gustavo Le Paige, que conta a história do povo atacamenho que já existia há séculos antes de Cristo. Ao lado do museu, fica a feira de artesanato, com belos trabalhos regionais e agasalhos feitos de pelo de vicunha e de alpaca. A população é constituída pelos descendentes da etnia Lican Antai ou atacamenha, de origem inca, que ainda mantêm seus costumes e ocupações. Na rua principal, a Calle Caracoles, fica a maioria dos restaurantes, barzinhos transados e agências de turismo sempre lotadas.

Bancas

Bancas com peças artesanais no povoado de Machuca, uma das várias comunidades de descendentes indígenas nas imediações de San Pedro de Atacama

Vale da Morte

A apenas 2 quilômetros de San Pedro, o Vale da Morte possui formações rochosas e dunas. O sedimento do solo é composto de sal e gesso, entre outros minerais, com uma coloração de rara beleza, entre o amarelo, rosado e branco.

Cordilheira do Sal

A Cordilheira do Sal foi modelada através de milhões de anos pela chuva e pelo vento surgindo, assim, impressionantes formas e esculturas naturais em variadas cores e com brilho em razão dos minerais que a compõem. A ação abrasiva das intempéries sobre essa formação geológica deu origem a uma sequência de cerros que se assemelham a um fole de acordeão.

Pela grande concentração de sal acumulada na superfície das formações, as rochas passam a fazer um escarcéu de estalidos durante o pôr e o nascer do sol em decorrência da mudança de temperatura. É como se centenas de pessoas ficassem estourando aquele plástico de bolhas ao mesmo tempo. Por isso elas são chamadas de “rochas que cantam”.

Lua

O Vale da Lua, situado a leste de San Pedro, é todo recoberto de sal, o que dá a característica cor branca

Vale da Lua

O lugar faz juz ao nome. Como ele bem diz, o Vale da Lua é famoso por sua conformação parecida com a superfície lunar devido às estratificações e afloramentos salinos ocasionados por agentes naturais. O cenário é um show, mas o espetáculo maior fica por conta do pôr do Sol apreciado por centenas de turistas a partir do topo das dunas do Vale da Lua. De lá tem-se uma visão panorâmica das cordilheiras Domeyko e dos Andes, bem como da cadeia de vulcões que circundam o vale, como o Licancabur, o Águas Calientes, o Lascar, o Línzor e o Acamarachi.

À medida que o sol se põe a coloração das montanhas vai tomando nuances que vão do amarelo ouro ao escarlate. O esplendor da paisagem causa arrepios, arranca lágrimas e salvas de palmas dos espectadores.

Gêiseres do Tatio

O campo de gêiseres do “El Tatio”, situado 99 quilômetros ao norte de San Pedro, proporciona uma visão “infernal”. A 4.300 metros de altitude, imponentes fumarolas com jatos de água quente emergem na superfície, através de fissuras na crosta terrestre, alcançando uma temperatura de até 85 graus centígrados e até 5 metros de altura. O ápice desse impressionante espetáculo pode ser apreciado nas primeiras horas da manhã entre as 6 e as 7 horas, quando a temperatura fica abaixo de zero. O fenômeno origina-se em razão do contato de um rio subterrâneo gelado com as rochas quentes que recobrem a região de origem vulcânica.

Salar de Atacama

Mais de 96% do volume da água que escoa para esse salar, vinda das montanhas, se evapora, enquanto 4% se converte em salmoura devido à alta concentração de sais. O sal vai brotando do solo e se acumulando na superfície, formando um relevo de crostas.

Grandes bandos de flamingos andinos povoam os salares, alimentando-se de uma espécie de camarão minúsculo chamado artêmia. A artêmia possui um alto teor de beta caroteno, o que dá a coloração rosada ao flamingo.

Na ida ou na volta do salar costuma-se visitar os povoados históricos de Toconao e Socaire. A pequena igreja de Toconao, em perfeito estilo atacamenho, é objeto favorito para fotografias.

Nas proximidades de Toconao fica também a laguna Cejar, onde os visitantes podem cair na água mesmo sem saber nadar. Como no Mar Morto, em Israel, a salinidade das águas é tão alta que ninguém afunda.

Termas de Puritama

Ao voltar do Tatio, a pedida é parar nas termas de Puritama e passar uma hora dentro de uma das várias piscinas alimentadas por fontes termais vulcânicas. Muito ricas em boro e outros minerais, as águas de Puritama são muito quentes e têm poder medicinal.

Vale do Arco Iris

Nem sempre a visita a esse vale faz parte do catálogo de ofertas dos hotéis. Simplesmente porque a zona ainda não está perfeitamente “organizada” para o turismo. Mas é exatamente isso que faz dele uma atração imperdível: o seu estado praticamente virgem. O nome se deve às estranhas formações de paredes rochosas de cor terra, muitas vezes combinada com brancos, amarelos e verdes, devido aos minerais ali existentes.

Vale

A Laguna Miscanti, no Atacama. Situada a 4 mil metros de altitude, é uma das mais belas lagunas altiplânicas do mundo

Lagunas altiplânicas

Continuando em direção ao sul do Atacama chega-se a um dos sítios mais impressionantes em termos de beleza: as lagunas Miscanti e Meñiques, situadas a 4 mil metros de altitude, quase na fronteira com a Bolívia. O azul turquesa de suas águas simplesmente não tem rival. Infelizmente o turista precisa caminhar apenas em pistas predeterminadas ao redor das lagoas, e não pode ir até as margens. Pela segurança ambiental do lugar: nas margens várias aves de médio porte que nidificam no chão costumam fazer seus ninhos, e elas não gostam da nossa presença.

Info: http://www.hotelkunza.cl/

Por: Luis Pellegrini, de San Pedro de Atacama, Chile – Brasil247

Notícias Relacionadas:

Comentários