Após 24 anos do Plano Collor, economistas apontam erros e acertos

16 mar 2014 - 18:07


Profissionais destacam o erro do bloqueio do dinheiro e apontam como benefícios a abertura da economia.

Foto: Terra

Foto: Terra

Lançado em 16 de março de 1990, o Plano Collor completa, neste domingo (16), 24 anos. Criado pelo ex-presidente e atual senador Fernando Collor de Mello um dia após a sua posse na presidência do Brasil, o plano tinha como objetivo conter a hiperinflação do país. Passados 24 anos, o Plano continua a ser tema de debates em salas de aula, por economistas e a sociedade, em sua totalidade.

Para esclarecer possíveis dúvidas sobre o Plano Collor, o CadaMinuto ouviu o economista e professor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da UFAL, Luiz Antonio Cabral, o economista e professor universitário Edmilson Veras, e os economistas Fábio Guedes e Isabell Marques.

O plano Brasil Novo, que continha um pacote de medidas econômicas apresentadas pelo governo Collor, tinha a pretensão de conter a hiperinflação no país, que chegava à 2.000% ao ano. Dentre as estratégias adotadas no plano estava o congelamento de depósitos de contas correntes e cadernetas de poupança que excedessem cinqüenta mil cruzados novos, o congelamento de preços e salários, que, posteriormente, seriam ajustados com base na inflação esperada, a liberação do câmbio para promover uma gradual abertura na economia brasileira em relação à concorrência externa, a redução do quadro de servidores públicos e a redução e extinção de institutos governamentais, conforme explicou o professor Luiz Antonio Cabral.

O equívoco do plano foi o confisco do dinheiro, dizem economistas

É unânime entre os economistas que o confisco dos depósitos das contas correntes e poupança foi um erro. “O confisco dos depósitos das contas correntes e poupança trouxe inquietação e sofrimento para a sociedade, visto que, uma grande parcela da população de baixa renda tinha a poupança como seu único patrimônio e fonte de renda. A medida favoreceu o desemprego e o desmantelamento do aparelho produtivo”, explicou o professor Luiz Antônio Cabral.

Cabral acrescenta que como conseqüência da adoção do plano, ocorreu uma grande retração econômica. “Houve um aumento do desemprego e muitas empresas fecharam as portas, outras reduziram sua produção, jornada de trabalho e salários, demitindo funcionários. Só em São Paulo nos primeiros seis meses de 1990, 170 mil postos de trabalho deixaram de existir, foi o pior resultado, desde a crise do início da década de 80”, afirmou.

O economista Fábio Guedes também ressaltou o erro do confisco e acrescentou que os bancos tiveram que restringir a sua capacidade de expandir financiamentos e crédito. “Um dos principais erros do Plano foi imaginar que confiscar os ativos de poupança da população brasileira poderiam debelar a inflação. Isso afetou muitas pessoas e, ao mesmo tempo, contrariou interesses muito fortes de dentro da economia, como o sistema financeiro-bancário que restringiu sua capacidade de expandir financiamentos e crédito”, explicou.

Outro equívoco apontado por Guedes está na redução e extinção de cargos públicos e a conseqüente redução de políticas públicas. “O fechamento de várias instituições estatais sob a alegação de que era necessário, a todo custo, fazer um ajuste fiscal nas contas públicas trouxe prejuízos às áreas científicas brasileiras, como por exemplo, a extinção do Ministério da Ciência e Tecnologia. Além do mais, o custo dessa redução foi altíssimo em termos de políticas públicas e cortes essenciais nas finanças do estado brasileiro”, finalizou.

O economista e professor Edmilson Veras destacou o conturbado período da gestão de Collor e também ressaltou o confisco do dinheiro, parte de um conjunto de medidas que integravam um plano que define como emergencial. “O governo violou um compromisso que ele assumiu com a sociedade e se impôs sobre o investimento financeiro, tornando aquele dinheiro, momentaneamente, inutilizável. Do ponto de vista estratégico, a medida de restrição foi equivocada”, disse.

Adotada por muitos governos no passado e ainda atualmente, Veras considera o tabelamento de preços como outro aspecto negativo do plano. “O tabelamento é uma forma de engessar o mercado. À época, quando os preços estavam tabelados, muitas pessoas venderam bens com o intuito de aproveitar os preços e temer que eles aumentassem e se endividaram. É impossível uma economia se fortalecer com o tabelamento de preços. Mas, ainda assim, atualmente, é possível perceber práticas do congelamento em países como a Venezuela, Argentina e no Brasil, com ações como o tabelamento da luz elétrica e o preço do combustível”.

Veras destaca a necessidade em equilibrar a receita federal e os gastos do governo para conter a inflação. “A inflação reflete em várias áreas no governo. Logo, é preciso haver um equilíbrio entre a receita federal e os gastos do governo. Pois, quando isso não acontece os gestores recorrem à emissão de novas cédulas e a empréstimos a bancos. Como empréstimo está sujeito aos altos juros, o dinheiro que seria investido em setores sociais em benefício da população é utilizado para o pagamento de dívidas”, explicou.

A abertura econômica foi um ponto positivo, apontam os estudiosos

Apesar das críticas em relação ao plano, os economistas avaliam pontos positivos, como a liberação do câmbio para promover a gradual abertura na economia brasileira em relação à concorrência externa e o aprendizado obtido com os erros para que estes sejam evitados em planos futuros.

Para Edmilson Veras, a redução de impostos de produtos importados foi fundamental para incentivar a concorrência nacional. “O Plano incentivou a abertura da economia brasileira em relação ao mundo quando reduziu os impostos para os produtos importados, ou seja, a redução e a importação desses produtos incentivou a concorrência aqui no Brasil”, afirmou.

Como aspecto positivo, Veras destaca ainda o aprendizado obtido com os acertos e equívocos. “O Plano apresentou alguns equívocos, como a restrição no uso da poupança, mas também favoreceu a importação de bens e incentivou a concorrência local, a exemplo do mercado automobilístico. Penso que o Plano trouxe aprendizados e lições que visam beneficiar a execução de outros planos”, finalizou.

Os economistas destacam ainda que as medidas adotadas, apesar de um curto período de tempo, reduziram a inflação. Fábio Guedes disse que o objetivo em derrubar a inflação foi alcançado nos primeiros quatro meses do plano. “A inflação saiu de 84% em março de 1990 para 7,9% em maio. Fechou o ano de 1991 com o IPCA a 472,7% contra 1.621% em 1990. Já em relação ao forte represamento do orçamento público, que teve no lema “Caça aos marajás”, o seu significado foi marcante, pois reduziu em cerca de 70% a dívida pública brasileira. Mas em meio à crise de governabilidade e os escândalos de corrupção em 1992, a inflação voltou a crescer fortemente e fechou o ano 1.119% e os dois planos Collor fracassaram rotundamente”, finalizou Fábio.

Pedido de desculpas de Collor

Em entrevista à rádio do Senado, em março de 2010, o ex-presidente Fernando Collor pediu desculpas à população pelo bloqueio do dinheiro. “Peço desculpas, as mais sentidas e as mais humildes, aos brasileiros que passaram por constrangimentos, traumas, medos, incertezas e dramas pessoais com o bloqueio do dinheiro. Lamento que tenha acontecido. Hoje, não faria de novo”, disse o ex-presidente em entrevista.

Na ocasião, Collor também ressalta os acertos do plano. “A minha agenda macroeconômica prevalece até hoje, quebrou tabus como a abertura da economia, a Lei da Informática, as reservas de mercado, as privatizações, o não-calote da dívida externa. Tudo isso era parte do plano de estabilização, mas hoje só falam no bloqueio do dinheiro.”, lamentou Collor.

O Plano Collor como tema de TCC

O Plano Collor também foi tema do Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), intitulado Plano Collor I, da ex-aluna e atual economista Isabell Marques. Segundo ela, a escolha do tema foi influenciada pela admiração por Fernando Collor e por considerar a relevância do Plano para o país. “A escolha do tema para o meu TCC foi influenciada pela admiração que tenho com o atual senador Fernando Collor desde quando era uma criança, sob influência da minha mãe, que também sempre o admirou”, explica Isabell.

Marques acrescenta ainda que a admiração por Collor também influenciou a sua escolha profissional, já que ele também é economista. “Quando já estava na faculdade de economia, questionei: por que não fazer o TCC de algo que foi marcante na história do país e que marcou a nossa economia?” justificou Isabell.

Em relação à contribuição do Plano Collor para a estabilização econômica do país, Marques avalia que o Plano preparou o ambiente para a implementação do Plano Real. “Sem duvidas, o Plano Collor foi importante e contribuiu para conter a inflação no chamado Plano Real em meados da década de 90, já posterior ao seu governo. O Plano Collor preparou o ambiente para o novo plano, normalizando um pouco o cenário que se verificava na época a partir da adoção de medidas com crescimento a longo prazo, como a abertura econômica, privatização de empresas e redução do estado”, finalizou.

Por Karine Amorim / Cada Minuto

Comentários