Reivindicação de ônibus gratuito tem defensores no meio acadêmico e exemplos práticos em municípios do Interior.
A tarifa zero para o transporte coletivo, uma das bandeiras levantadas pelos manifestantes que protestam contra o aumento da passagem em Porto Alegre, São Paulo e Rio, já é uma realidade em cidades do interior do Brasil. Os municípios de Ponto Real, no Rio, Ivaiporã, no Paraná, e Agudos, em São Paulo, oferecem gratuitamente à população o serviço público de transportes.
Somadas, as populações das três cidades não ultrapassam os 100 mil habitantes, enquanto a capital paulista possui mais de 41 milhões de moradores. Apesar da diferença de tamanho territorial e populacional, alguns especialistas nas áreas de mobilidade urbana e de administração pública acreditam ser possível a aplicação da tarifa zero na capital.
“A aplicação da tarifa zero independe do tamanho da cidade. Ela é possível, mas depende do planejamento financeiro de cada município. Numa cidade do tamanho de São Paulo, o planejamento técnico precisa ser muito maior, além de envolver também os governos estadual e federal”, explica Lúcio Gregori, secretário de Transportes da cidade durante a gestão de Luiza Erundina (PT), em 1990. Ele foi responsável pelo projeto da tarifa zero para a cidade, que acabou não sendo votado pela Câmara de Vereadores.
Gregori afirma que a gratuidade do transporte coletivo já é uma realidade – e bem sucedida – em cidades de médio porte em outros países. “Nos Estados Unidos, há 32 cidades com média de 400 a 500 mil habitantes que adotam a tarifa zero”. Especialistas da Unicamp e da Unesp também destacam a experiência em diversas cidades de médio porte da Europa, entre elas a capital da Estônia, Talinn. Sidney, na Austrália, também oferece linhas de ônibus gratuitas. No Brasil, a cidade de Paulínia, a 118 quilômetros de São Paulo, com mais de 82 mil habitantes, teve tarifa zero até 1990.
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Gregori queria subsidiar os ônibus com o IPTU. A ideia era aumentar a taxa conforme o valor do imóvel. “Assim casas de luxo e imóveis comerciais teriam uma elevação maior de tributo”. O ex-secretário diz que o projeto enfrentou questões de disputa política e de interesse econômico das empresas de transportes. “Uma pesquisa feita em dezembro de 1990 revelou que 76% da população era favorável ao aumento do imposto desde que destinado ao transporte público”.
Segundo as secretarias de Transporte das cidades brasileiras que praticam a tarifa zero, o subsídio é 100% pago com a arrecadação municipal, mas não exclusivamente do IPTU. “A tarifa zero é uma questão de investimento do transporte coletivo em detrimento do individual, de socialização dos recursos do transporte urbano”, resume o especialista em administração pública da Unesp, Álvaro Guedes.
Para quem defende a tarifa zero, o transporte coletivo gratuito traz ganhos econômicos para a cidade. “Em primeiro lugar, todas as atividades econômicas só são viáveis a partir do momento em que a população consegue acessar o seu local de trabalho”, diz Gregori. Redução de veículos particulares nas ruas, diminuição do congestionamento, menos tempo perdido no trânsito e, consequentemente, maior produtividade é uma outra lógica favorável à ideia. Já o professor Diogenes Costa, da Unicamp, acredita que o tamanho continental do Brasil e a complexidade das vias urbanas impedem a aplicação da tarifa zero em cidades maiores. A qualidade do transporte público oferecido, diante de um aumento da demanda pela gratuidade, também preocupa o acadêmico.
Por Jornal do Comércio