O Ministério da Educação homologou o Parecer do Conselho Nacional de Educação (CNE) que determina a carga horária na modalidade EAD dos cursos de Licenciatura, dentre elas a pedagogia, que conta com o maior número de alunos à distância. Assim, a grande manchete é que não haverá mais Licenciaturas com menos de 50% de presencialidade. E com esta proposta, tanto CNE como MEC destacam a sua “preocupação” com a qualidade da formação de professores. Um posicionamento com equívocos claros.
A experiência de membros das duas câmaras do CNE e dos cargos executivos do MEC nos faz acreditar que este parecer não apresenta erros técnicos por falta de competência, mas traz um discurso ilusionista que culpa a modalidade EAD pela falta de qualidade dos docentes formados.
Ainda na virada do século XX para o século XXI a qualidade dos professores formados era um grande problema de Estado Federal e, por consequência, dos estados e dos municípios. Neste momento, o EAD era incipiente e só existia para formar professores em programas especiais visando atender regiões muito remotas de um país continente.
Passados 24 anos deste momento histórico citado, a Educação Superior cresceu mais de 230% em volume de matrículas e a modalidade EAD já representa 51,5% dos matriculados. O curso com a maior taxa de matrículas é a Licenciatura em Pedagogia.
Agora, o que significa determinar por lei que as licenciaturas não podem ter mais do que 50% da sua estrutura curricular na modalidade EAD?
Existem algumas respostas, dentre elas o fato de que o MEC não estudou devidamente uma proposta de estrutura curricular adequada para as licenciaturas que efetivamente encantasse os alunos e revitalizasse pelo saber os candidatos. Culpar a metodologia de oferta é a forma mais fácil de justificar a falta de avanços.
A modalidade EAD, nos seus primórdios existia apenas para formar professores em regiões remotas. Mas ao invés de ter se especializado com novas estratégias que permitissem a sua multiplicação, a oferta dos cursos se tornou enfraquecida pela estrutura das diretrizes que exigem abordagens metodológicas retrógadas e muito pouco alinhadas com a realidade da sociedade moderna. E é justamente assim que se forma bons professores.
O erro maior deste parecer, que abarca todas as licenciaturas, não está na restrição da carga horária EAD, mas no fato de não trazer detalhamento de novas metodologias e de necessidades curriculares importantes que associem a educação à realidade social. A mudança não incorpora autores atuais que tratam de neuroapredizagem, da performance cognitiva e muito menos de ferramentas digitais relacionadas a gamificação e gestão da trajetória de estudos.
Batalhar contra o EAD na formação de professores é o mesmo que impedir por decreto que os sistemas operacionais baseados em ícones fossem aplicados em favor do sistema operacional DOS (tela escura e códigos digitados) nos cursos de Tecnologia da Informação. É o mesmo, que, nas carreiras de Mecânica, os sistemas Digitais denominados CAD (computador auxiliando o desenho), CAM( computadores auxiliando a manufatura), os tornos de comando numérico e os robôs fossem considerados ilegais e fossem renegados pelas diretrizes curriculares.
A regulação desenvolvida e votada pela Câmara Plena do CNE e homologada pelo Ministro da Educação não traz nenhum aprimoramento nas estratégias, nos temas a serem estudados obrigatoriamente e nem mesmo na abordagem tecnológica essencial. A realidade social pós-pandemia, onde os negócios e as comunicações se consolidam online e o tema Inteligência Artificial se torna cada vez mais presente na realidade e na vida dos cidadãos do mundo.
Se existe um documento fora do contexto social, sem fundamentação técnica para a sua existência e com pouca expectativa de resultados é este parecer do CNE para as Licenciaturas. O principal problema da formação de professores não está na etapa da graduação, somente, e sim na carreira que se desqualificou ao longo da história do país.
Ser docente hoje não é mais uma expectativa positiva de carreira. Para receber uma remuneração da ordem de R$ 4 a R$ 5 mil, o formado precisa se aplicar a trabalhar em 3 a 4 instituições e ter que lidar com situações que só desqualificam a formação do professor. É a política pública que valoriza o corpo docente quanto a remuneração, apoio e recursos para o exercício da carreira que falta ser debatida e aplicada.
Ao contrário do que se propõe, aprimorando a qualidade da formação, esta regulação vai diminuir a oferta de licenciaturas pelas IESs privadas, vai inviabilizar que muitos jovens e adultos estudem para ser professores e a qualidade tão apregoada não tem alicerce regulatório para florescer.
Temas como este preocupam pela sua importância, pela sua ineficiência de aplicação e pela real falta de alternativas trazidas pelas esferas federais legislativa (CNE) e executiva (MEC) na expectativa de soluções de problemas.
*César Silva é diretor Presidente da Fundação de Apoio à Tecnologia (FAT) e docente da Faculdade de Tecnologia de São Paulo – FATEC-SP há mais de 30 anos