O Prêmio Ana Maria Vieira Almeida recebido, em Lisboa, Portugal, pela pedagoga Jeane Amaral, egressa do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE) da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), coloca em destaque internacional a instituição alagoana na área de Educação Infantil. A premiação foi na categoria relacionada à Inovação Pedagógica, com o trabalho intitulado A Criança, a Cidade e o Patrimônio no âmbito da Educação Infantil: Identidade Cultural, Pertencimento e Participação, fruto de sua tese de doutorado concluído em 2020, sob a orientação da professora Lenira Haddad, da Ufal, e co-orientação de Maria Assunção Folque, da Universidade de Évora, instituição portuguesa.
O Prêmio Maria Vieira de Almeida, com primeira edição realizada este ano, é instituído pela Fundação Vasco Vieira de Almeida e tem apoio da Fundação Calouste Gulbenkian, ambas situadas em Lisboa. Tem como finalidade dar visibilidade a trabalhos de investigação em modelos inovadores na área da educação infantil, pré-primária e primária, tendo um carácter bienal. A solenidade de premiação ocorreu no dia 3 deste mês na Fundação Calouste Gulbenkan. Na oportunidade, Jeane Amaral estava acompanhada das professoras Lenira Haddad e Assunção Folque.
Jeane Amaral destaca que a pesquisa qualitativa se deu por meio de uma aproximação nos campos do estudo contemplando as cidades históricas de Penedo, em Alagoas (Brasil) e Évora (Portugal). A pesquisa de campo ocorreu entre os anos de 2018 e 2019, junto a dois grupos de crianças entre 3 e 6 anos e suas respectivas educadoras nas citadas cidades. Penedo e Évora, são tombadas, respectivamente, pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).
O estudo desenvolvido por Jeane durante o doutorado no PPGE da Ufal, buscou compreender as dimensões teóricas e práticas que compõem uma proposta que relaciona Criança, Cidade e Patrimônio no âmbito da Educação Infantil. E, quanto o que considera como maior contribuição do trabalho premiado para os avanços na área em foco, ela destaca as vivências, e diz: “A partir das vivências narradas e analisadas, deve-se a compreensão de que habitar a cidade por meio de experiências ricas de participação e ocupação contribuem para a significação e ressignificação do patrimônio cultural pelas crianças. E, consequentemente, a ampliação da sua identidade cultural e pertencimento”, frisa a pesquisadora, que concluiu o doutorado em 2020.
Jeane acrescenta que a premiação se deu por duas categorias, ambas relacionadas à Inovação Pedagógica. Uma na Educação para Infância que no Brasil é denominada de Educação Infantil e a outra para a Educação primária (como eles ainda chamam em Portugal) mas que aqui no Brasil é denominada de Ensino Fundamental I do 1º ao 5º ano. O outro trabalho vencedor, também na categoria Inovação Pedagógica, foi o denominado de Arriscar a Mudança. Os desafios dos modelos multinível no ensino da leitura e da escrita de autoria de Fernanda Leopoldina Parente Viana. Para mais informações, clique aqui.
Também em Portugal, no dia seguinte à premiação (4), Jeane participou como conferencista do Encontro Criança, Cidade e Patrimônio onde abordou o tema: Crianças e territorialidades: caminhos na construção da identidade e pertencimento. O evento teve como local o Palácio D. Manuel Évora, e foi promovido pela Câmara Municipal de Évora e as Comissões de curso da Licenciatura em Educação Básica e dos mestrados em Educação Pré-escolar, assim como, Educação Pré-escolar e Ensino do 1º Ciclo de Ensino Básico (CEB), da universidade portuguesa. Além de contar também com diversas instituições sociais e culturais da cidade de Évora, segundo a pedagoga, envolveu de forma especial, a Ufal, a partir de estudos realizados, seguido de premiação e participação na programação, como conferencista.
Pesquisa: inovação e pertencimento
Jeane aproveita para destacar que a qualidade dos professores da pós-graduação e especialmente a possibilidade de intercâmbio internacional a ela proporcionada por meio dos contatos e parcerias que o PPGE da Ufal promoveu muito por meio do intermédio da sua então orientadora, Lenira Haddad. Além do convívio e troca de experiências com os colegas do Grupo de Pesquisa (GPEIDH), proporcionando, dessa forma, a participação, para além da pesquisa de algumas atividades de extensão, como a organização de eventos.
Sobre o que a premiação representa numa tão desafiante área de Alagoas, a educação, ela faz o destaque para a positividade da conexão entre as duas instituições envolvidas. “Representa o reconhecimento de muita dedicação e parceria entre os pesquisadores do PPGE da Ufal e a Universidade de Évora que uniram esforços no sentido de promover troca de saberes em um projeto intercultural”. E, nessa positividade, para otimização do trabalho, acrescenta: “Situo-me nesse contexto como uma pesquisadora que se dedicou à pesquisa com afinco, fazendo uma imersão nos campos da pesquisa e promovendo trocas culturais entre os envolvidos na pesquisa nos dois países (crianças e educadoras). Portanto, considerando os envolvidos na pesquisa como partícipes em todos os momentos”.
A pesquisadora reforça que o trabalho possui caráter inovador por associar a relação entre patrimônio e a educação infantil em duas cidades histórias em países diferentes: Portugal e Brasil. Enfatiza, nesse sentido, a importância de ocupar os espaços públicos das cidades com as crianças, especialmente os relacionados a identidade local, a fim de oportunizar um maior pertencimento pelas crianças desde bebês ao seu território. Impacta não apenas a área da educação da infância, mas também a área das artes e também a área cultural para a infância.
“Nesse sentido, estimula o diálogo e parcerias que oportunizem a visibilidade e pertencimento dos bens patrimoniais, sejam eles relacionados aos sítios históricos ou saberes e fazeres culturais locais. Também contribui com reflexões e propostas para pensarmos em políticas públicas voltadas para a primeira infância que permitam considerar os direitos de participação dos bebês e crianças nos espaços públicos e culturais das cidades e seus diversos territórios. O Estado de Alagoas, segundo o mapeamento do Patrimônio Cultural de Alagoas pelo IPHAN, é considerado o segundo menor estado do Brasil”.
Reúne mais de 30 manifestações folclóricas e o maior número de folguedos vivos em atividade, dentre eles: Bumba meu boi, Guerreiro, Coco de Roda, Pastoril, Fandango, Cavalhada, Chegança, Maracatu, Reisado, dentre outros. Penedo, como um dos municípios mais antigos do estado, para além do patrimônio histórico, traduzido no arcabouço arquitetônico ainda conservado, também possui uma vasta riqueza, no que diz respeito ao patrimônio cultural.
“Nesse sentido questionamos: todo esse patrimônio disposto é amplamente difundido através das propostas curriculares desde a educação infantil? Esse é um desafio, especialmente na educação da infância, além da ocupação e participação da criança nos espaços públicos na cidade. A tese visou dessa maneira elencar as dimensões que precisam ser consideradas ao relacionar criança, cidade e patrimônio e dentre essas dimensões a força da cultura local e dos territórios se mostrou essencial para o fortalecimento da identidade cultural e pertencimento das crianças desde a educação infantil”, destacou Jeane Amaral.
Trajetória
Na Ufal, Jeane só fez o doutorado. Ao falar sobre a sua trajetória quanto à formação e atuação profissional, diz que depois de mais de 15 anos atuando na Educação Básica, apenas com a formação em Pedagogia, feita na Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS), na Bahia, sentiu a necessidade de enveredar pelo mundo da pós-graduação na área de Educação Infantil, onde sempre atuou. Fez mestrado na Universidade Federal de Sergipe (UFS) e em seguida, o doutorado na Ufal, tendo atuado em todos os níveis da educação e modalidade. Atualmente pertence ao corpo docente da Unidade de Educação Infantil da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), na Paraíba.
Educação infantil: construção e diálogo
Para a orientadora Lenira Haddad, o trabalho premiado tem um impacto social e político para o PPGE da Ufal, pois evidencia-se a qualidade da pesquisa desenvolvida e a contribuição para a área da educação nos âmbitos local, nacional e internacional. “Por meio da premiação da tese, confirma-se a consolidação do PPGE como um programa de pós-graduação que, ao longo de seus 22 anos, formou pesquisadores e contribui com a educação básica”, enfatiza.
Ela diz que é importante destacar que a pesquisa realizada se insere em um projeto maior intitulado de A criança, a cidade e o patrimônio: diálogos com os saberes e fazeres das comunidades penedense e eborense (Portugal), realizado em parceria com a Universidade de Évora. “O trabalho envolveu várias ações e projetos visando qualificar a educação da infância dentro e fora dos muros escolares, em constante diálogo com o patrimônio cultural e natural das cidades envolvidas”, explica.
Ela afirma que a tese de Jeane configura a construção desse diálogo entre Évora e Penedo no âmbito da educação infantil em três tempos. E complementa:
“Primeiramente, a partir da sua imersão no campo profissional de Évora vivenciando o trabalho realizado pelas educadoras com as crianças na cidade. Posteriormente, acompanhado as professoras de Penedo em missão de intercâmbio em parceria com as educadoras de infância da cidade portuguesa. Por último, em Penedo, criando possibilidades para a vivência das crianças em situações extramuros com esse olhar para os saberes que as crianças já trazem, compartilham ou adquirem nas andanças à deriva ou direcionados”.
Conforme Lenira, a pesquisa premiada traz uma grande contribuição para a visibilidade da criança na cidade, sua participação e o exercício da cidadania, sinalizando outros modos de fazer a educação infantil assentados na ideia de fortalecimento da identidade e pertencimento cultural.